Editorial

A Crise da Habitação para os jovens em Portugal

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Paula Veiga

Recentemente, tive a oportunidade de ouvir a Ministra da Juventude falar no telejornal sobre as novas medidas anunciadas para facilitar o acesso dos jovens à habitação em Portugal.

Infelizmente, em vez de trazer esperança, a informação apenas aumentou a  minha preocupação. Resolvi investigar mais a fundo, fazendo algumas simulações financeiras que me deixaram ainda mais chocada. A realidade é que as promessas e medidas dos sucessivos governos parecem ser pouco mais que “areia nos olhos” dos cidadãos, sem soluções eficazes para os problemas que realmente afetam os portugueses. Esta é uma questão urgente que merece ser discutida com seriedade.

Atualmente, os preços dos imóveis estão em níveis inacessíveis para a maioria dos jovens portugueses. É quase inconcebível que um jovem possa pensar em adquirir uma casa ou apartamento com os salários que predominam no mercado e os com os valores imobiliários atualmente praticados.

Com um salário mínimo fixado em 820 euros, ou até mesmo com salários que se situam um pouco acima disso, é quase impossível que um jovem consiga sustentar uma prestação mensal de 562 euros, no caso de quererem comprar, por exemplo, uma habitação com o valor de 125000 euros. Isso sem considerar outras despesas básicas como alimentação, transporte, educação, e lazer. A questão que fica é: como é que os jovens poderão aceder à habitação sem comprometer a sua qualidade de vida e segurança financeira?

As medidas anunciadas pelo governo parecem promissoras à primeira vista, mas, ao analisar de perto, fica claro que há uma desconexão entre a teoria e a prática. Avaliando algumas das propostas feitas pelo governo, porque estas podem não ser a solução efetiva que os jovens precisam. Os incentivos fiscais são frequentemente mencionados como uma solução para tornar a aquisição de imóveis mais acessível, no entanto, a realidade é que a maioria dos jovens não têm salários suficientemente altos para que os incentivos fiscais ofereçam um benefício substancial. Com salários médios e baixos, a isenção de impostos anunciada não se traduz num alívio financeiro significativo e eficaz.

Fica, portanto, quase claro que esses incentivos são direcionados apenas a uma faixa limitada da população, deixando de fora a  maioria dos jovens.

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Por outro lado, as exigências bancárias são rigorosas e os critérios de elegibilidade para esses programas podem ser difíceis de cumprir. Os jovens, frequentemente em empregos precários ou temporários, podem não ter o histórico financeiro necessário para garantir um empréstimo.

A acrescentar a isto, a  promessa de taxas fixas é frequentemente enganadora. As taxas de juros podem variar, especialmente após o período inicialmente contratado, tornando as prestações imprevisíveis e potencialmente insustentáveis (sobretudo com as famigeradas “crises financeiras”, cada vez mais cíclicas).

Estes programas são apresentados como soluções para oferecer habitação a preços acessíveis, contudo, a disponibilidade de habitações realmente acessíveis é extremamente limitada. A procura supera em muito a oferta, e muitos jovens continuam sem acesso às opções prometidas.

Fica assim provado que os incentivos diretos para a compra de habitação são outra medida popular, uma vez que o valor dos subsídios e isenções pode ser insuficiente para cobrir a diferença entre o custo real de um imóvel e o que um jovem pode pagar.

Para ilustrar melhor a situação, foram feitas algumas simulações para a aquisição de uma casa, para habitações com valores de 125000 euros, 150000€ e 200000€, que comprovam, exatamente, que estas medidas não dão resposta à maioria dos jovens que pretendam adquirir uma habitação.

O aumento significativo nos preços das habitações, especialmente nas áreas urbanas, a especulação imobiliária e a falta de regulação eficaz, quer dos negócios imobiliários quer dos juros e taxas dos empréstimos bancários, contribuíram para esta situação, tornando a compra de imóveis quase impossível para jovens com salários médios ou baixos. Não obstante, a precarização do mercado de trabalho, com salários baixos e empregos instáveis, dificulta a capacidade dos jovens de planear e economizar para um imóvel. Sem garantias de emprego estável, é arriscado qualquer jovem comprometer-se com uma hipoteca de longo prazo.

A realidade é que os jovens em Portugal enfrentam uma crise habitacional que os deixa numa posição insustentável e preocupante. Enquanto os governos prometem soluções, a desconexão e disparidade entre as políticas anunciadas e a realidade vivida pelos jovens é evidente. É crucial que as políticas habitacionais sejam revistas e melhor adaptadas para oferecer soluções práticas e acessíveis.

Ao invés do que foi anunciado, o que poderia, efetivamente, ser feito? Não é preciso ser economista para perceber que a solução deste grave problema devia incidir, primeiramente, na regulação do mercado imobiliário, com a implementação de medidas de controle para evitar a especulação e estabilizar os preços dos imóveis. Depois, criar programas que incentivem empregos estáveis e bem remunerados para os jovens, investir na construção de habitações verdadeiramente acessíveis, especialmente nas áreas urbanas, onde a procura é maior e, finalmente, ajustar com as entidades financeiras critérios (taxas e juros) para tornar a aquisição de habitação mais viável para jovens com rendimentos mais baixos, acabando com o ciclo vicioso de especulação e cartelização financeira praticada, desde há décadas, pelas instituições financeiras.

A verdadeira solução requer um esforço coordenado entre o governo, as entidades financeiras, o setor privado e a sociedade para abordar essas questões de forma séria, abrangente e justa. Sem isso, as promessas continuarão a ser apenas palavras vazias, e os jovens permanecerão à margem do mercado imobiliário, sem condições para construir uma vida realmente digna, a vida que uma sociedade verdadeira democrática e civilizada deve promover.

 


 

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