Editorial

A raspadinha: o casino ao virar da esquina

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Um estudo recente, realizado pelo Centro de Estudos Sociais (CES) e pela Universidade do Minho, veio confirmar aquilo que muitos já sabiam sobre a raspadinha – e, pior ainda, aquilo que quem a colocou no mercado sempre soube: é um jogo imoral, desenhado para explorar as classes mais pobres e com um elevado potencial de criar dependência.

A fórmula do vício é simples: aposta-se pouco dinheiro, alimenta-se a esperança de grandes ganhos – graças à muita publicidade apresentada nos meios de comunicação social em horários que visam este público-alvo – e tudo culmina num resultado imediato, que prende e vicia. O facto de o resultado do jogo ser obtido no mesmo instante em que se joga leva a que se jogue novamente, na expectativa de que o almejado prémio venha a sair. Este salto curto, de expectativa em expectativa, é o ingrediente que faz do jogo um vício fácil de adquirir. Assim sendo, este tipo de jogo só poderia ter lugar num ambiente regulado, com controlos e restrições para entrar, como acontece nos casinos.

Mas, ao contrário dos casinos, a raspadinha está à disposição de todos, em qualquer esquina, sem filtros ou limitações. Miúdos, adultos, desempregados, reformados com pensões baixas – é quem se vê a jogar numa mesa de café, num quiosque de jornais e nos supermercados. Todos têm acesso a esta ilusão. A grande maioria joga desesperada, com contas para pagar e à espera de que a raspadinha os ajude, pelo menos, a chegar ao final do mês.

A promessa de dinheiro fácil, de riqueza instantânea, logo ali ao virar da esquina, é sedutora, mas enganosa. Os prémios de baixo valor ainda vão saindo, o que faz com que quem ganhe volte a jogar, na esperança de sair algo maior, num ciclo que gera vício. Os grandes prémios são raríssimos e, considerando o número astronómico de raspadinhas vendidas diariamente, as probabilidades de ganhar um prémio significativo são quase nulas. É (quase) mais fácil encontrar um tubarão no rio Lima do que ganhar uma quantia avultada!

Este jogo, apresentado como inofensivo, é, na realidade, uma armadilha. Alimenta-se da vulnerabilidade de quem já enfrenta dificuldades, oferecendo uma ilusão que apenas agrava vidas marcadas pela angústia e pelo sofrimento. E não me refiro apenas a quem joga, mas, em muitos casos, a famílias inteiras que são afetadas, quer pelo dinheiro gasto, quer pela ansiedade e frustração que o jogo desencadeia.

A raspadinha é, verdadeiramente, um jogo de azar. Um azar encomendado e, por isso, ainda mais chocante. Um engodo. No fundo, uma fraude social disfarçada de diversão. Uma fraude que prejudica aqueles que já têm uma vida, todos os dias, defraudada!

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