A última viagem

Quem de nós não se recorda de um local, onde foi por obrigação, ou por uns dias de férias, ou por outras obrigações, e odiou estar, naqueles sítios que, jurou em que jamais voltaria.?

Mas voltou.

Ou de ouvir dizer: “detesto aquela cidade, ou aquela terra, porque lá tive uma má experiência,” etc.? Como se o local tivesse alguma culpa no acontecimento!

Mas também ouvimos dizer: “conheço bem aquela terra, ali, fui muito feliz”? Também se ouve amiúde.

Como é normal, privilegiamos mais o lado bom da vida em detrimento daquele que, por algum motivo, noz azedou esses momentos.

Em minha opinião, esses radicalismos, tem tudo a ver com a nossa pouca idade e, consequentemente, a falta de experiência que só a vida nos confere.

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Naquelas idades, é oito ou oitenta, não há meio termo, porque nos falta a experiência que só os anos nos dão.

Eu falo por mim, pela minha experiência de vida, que me permite, hoje, olhar para traz e ver o quão despido estou desse radicalismo. Despeguei, completamente deste e de outros assuntos.

Estava eu a cumprir o Serviço Militar Obrigatório na bela cidade de Chaves, e embora esta permaneça no mesmo local, hoje é muito mais fácil chegar a Chaves e logo mais perto.

Sair de casa às 18 horas para chegar ao quartel pelas cinco da madrugada é, hoje, impensável. É que nem duzentos quilómetros são.!

Tudo isso, aliado à inexperiência e à saudade. Foi a primeira privação da família e da terra. Tudo isto desenvolveu em mim um sentimento de impotência e de raiva a ponto de dizer: ”Quando, ao fim da escola de cabos, sair as portas deste quartel, juro que não olho, nem uma vez, para trás.”

E assim aconteceu.

Quinze anos depois voltei a Chaves e até fui visitar o quartel. Olhei para ele de forma absolutamente diferente e neutra, e recordei os quase quatro meses que vivi ali.

Já os olhei de outra maneira mas, as pazes, digamos, ainda não estavam completamente feitas. Havia mais uns anitos para as resolver, não por mim, que achava estar resolvido, mas pelos Agostos da vida que, ainda faltavam.

Sim, são estes que nos trazem a razão de ser e aceitar acontecimentos posteriores, de extrema relevância, e analisar a importância que estes tiveram na minha maturidade.

Quando em 2010 voltei, já tinha as pazes, definitivamente, feitas com Chaves e até com a cidade do Porto, onde também estive.

Há muito tempo que a razão, e a maturidade trouxeram o lado positivo e único, que me fez ver, e crescer que, as terras não chamam por nós, nada têm a ver com o desenrolar dos acontecimentos da nossa vida.

Há anos que aferi a importância que constituíram esses tempos na consolidação da minha estrutura psicológica, amorosa e emotiva, ao ponto de verificar o quão determinantes são hoje na minha vida.

Passei a ver a família com um olhar fortemente, ampliado, aquela a que, por via da privação forçada, perdi, e activou a sua enorme valorização. E também a minha terra, passou a ter outro valor.

Sair de casa com vinte anos e chegar a uma terra onde tudo nos é estranho, onde nos dizem, mal entrei no quartel: “aqui, não há Pai nem Mãe, aqui quem manda somos nós,” os oficiais, sargentos e outros, é algo que me puxou à terra e evidenciou a minha pequenez.

 

(José Venade não segue o actual acordo ortográfico em vigor).

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2 comentários

  1. Só tenho um comentário a fazer.
    Um bem haja a quem acabou com a obrigatoriedade da tropa.

  2. Susana Faria, também eu durante alguns anos, tive essa opinião.
    Mas, por muitas razões, hoje acho que foi um erro.
    Economicamente, não se poupou nada.
    Os quartéis estão ao deus dará.
    Daí para cá, as gerações não têm a noção de uma verdadeira partilha. Hoje vivem na sombra dos pais” helicóptero”, ao seu redor.
    Pelo menos, um mês, só lhes fazia bem. A eles e a elas.
    Essa seria uma verdadeira lição de Cidadania, pode crer.

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