Editorial

AINDA À VOLTA DO DESMAME
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Zita Leal

Zita Leal

Professora

(Aposentada)

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Pior do que o desmame dos almoços de domingo que à volta da mesa juntam famílias, amigos quando calha, é o desmame do toque. Falo do toque da mão que pressiona o ombro quando faltam as palavras solidárias com a dor de um amigo, falo do abraço que sela um encontro, falo do toque da mão que afaga um rosto sofrido, falo do toque dos dedos quando substitui um beijo, falo de todos os toques que tecem fios indestrutíveis entre as pessoas.

Quem tiver Skype, face e afins consegue ver o rosto dos filhos, dos netos, de todos os que lhe são queridos, mas…beijá-los na frieza de um écran? Como os publicitários dizem “ podia ser mas não era a mesma coisa “.

E aquela dislexia de movimentos que impede a boa recepção das imagens? “ Mãe, ponha a câmara mais para cima que só lhe estou a ver o cocuruto e queria ver-lhe a cara, mãe ligue o microfone“. E a mãe a sentir-se analfabeta de netos, e a mãe a sentir-se mesmo inculta destas artes informáticas…

Pergunto-me: para quem está já no último degrau da rampa, esta separação dos toques de afecto não será demasiado dolorosa?

É uma outra variante do desmame. A natureza sabe o que faz. Este distanciamento vai-nos preparando para a separação total que nos espera. Os beijos não são mais repenicados, os abraços não são mais apertadinhos e a gente vai-se habituando à ideia da terra do “ nunca mais “.

E agora quando escrevo aos amigos virtuais no final das frases, “ aquele abraço “, sinto que seria muito mais feliz se lhes desse mesmo “ o abraço “.

Já chega de desmames!

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