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Alexandra Vieira de Almeida: A dupla face da montanha – Para Denise Emmer

Alexandra Vieira de Almeida 1

Alexandra Vieira de Almeida

 Escritora e Doutora em Literatura Comparada (UERJ)                                                                                     

Penso nesta imagem, uma montanha isolada, sem nada ao redor no eterno instante do vazio. Segundo Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, tal lugar é o espaço das epifanias e das iniciações, pois uniria a terra e o céu. Para Nietzsche, seria a morada do filósofo, solitário e distante como ele é. Mas também não seria o lugar do poeta, que uniria dois extremos: o transcendente e o imanente?

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O metafísico e o físico clamam pela imagem do amor inaugural, o amor que temos quando vemos algo grandioso e abismal para nossos olhos. O amor ao sagrado seria o amor pelo sublime que se debruça sobre a imagem do vasto, pois, quando amamos, vemos a imensidão do infinito sem a medida das consequências. A montanha parece-me levar para esse outro espaço que não está apenas presente na realidade física à nossa volta, mas que aponta para um além que se encontra na própria dimensão da intuição. Intuímos melhor quando vemos além da projeção de figuras ilusórias e nos concentramos no real sentido do gesto.

Amar é intuir a melhor opção dentre inúmeras possibilidades que se descortinam a todo momento. Não naufragar nas águas remotas do tempo ignoto, mas subir até o cume da montanha e avistar com olhos da intuição da águia o segredo do sagrado que reside no amor pelo gesto, que oferece um presente de comunhão viva.

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A montanha longínqua, também está próxima, pois o distante também aproxima, no paradoxo do real sentido. Mas tal gesto não nos leva à certeza da afirmação categórica, mas à incerteza incompleta, que se configura na busca por se completar pelo gesto do outro.

Não é apenas um gesto unívoco, mas num duplo sentido do esforço que se abre como duas rodas em movimento incessante. Ao pensar no ar rarefeito da montanha, podemos perceber o perigo de um sufocamento, de uma falta de algo, de um vazio que quer ser preenchido, mas o outro nos preenche com a natureza do gesto amoroso, mostrando-nos a contradição da imagem da montanha: falta e plenitude, imanente e transcendente, o físico e o metafísico.

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Intuir para que esse duplo sentido aflore numa flor desperta em meio ao ar rarefeito. Ao ser perguntado por que escalava montanhas, o grande alpinista francês Lionel Terray disse: “Eu escalo montanhas porque elas estão lá!”

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