Ar de defunto e outras superstições

Ainda em democracia, continuaram as superstições e mitos sobre muitas coisas que hoje sabemos serem paliativos, na ausência da medicina. Talvez, mais, nas aldeias do que nas cidades, penso eu, porque não tenho como aferir este pensamento.

O ar de defunto, era um deles. Todas as pessoas que fossem a um funeral ou que, de alguma maneira, tivessem contacto com alguém da família do morto, tinham que se defumar.

No regresso do funeral, uma simples fogueira de palha no chão, com um pouco de alecrim, se houvesse, servia para defumar várias pessoas e, desta forma, ficavam livres do ar de defunto e de contagiar aqueles que não foram ao funeral.

Se não o fizessem, as implicações podiam repercutir-se nas crianças ou adultos. Se uma criança não se desenvolvesse, era levado à presença de uma pessoa habilitada, para lhe fazer rezas e defumatórios, a fim de ser curado do ar de defunto.

Também havia o ar de bicho, fruto da criançada andar em contacto com a natureza, nomeadamente, com os bichos dos pinheiros e, o corpo, apresentar borbulhas em locais incertos.

Era levado à presença de um ou uma curandeira que lhe aplicava, sobre o local, umas folhas de silvas, por elas escolhidas, um pouco de azeite, ao mesmo tempo que, manejando uma faca sobre a zona afectada, com movimentos estudados, dizia uma ladaínha e uma oração. Passados uns dez dias, a coisa passava, por ela mesma, e não pelas mezinhas, é claro.

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Desaguar as pessoas e os animais. Havia, por aquele tempo, muitos animais, como as vacas, que percorriam as aldeias, assim como pessoas carregadas com feixes de erva ou braçadas de couves e até carros de bois com milho para desfolhar. Se, em sentido oposto, viessem outros animais, e partindo do princípio que as vacas estavam prenhas, devia-se dar alguma comida para não aguarem, sobe pena de desparirem; ou seja de perderem a cria. O remédio consistia em roubar nove couves em hortas distintas para dar ao animal aguado. Problema resolvido

O mesmo se aplicava a uma mulher grávida, até, porque quem lhe negasse um pouco de comida, podia nascer-lhe um terçolho no olho, como castigo.

Procedimento semelhante se aplicava com as crianças quando, por exemplo, fossem a casa de alguém que estivesse a comer. Tinham que partilhar com a criança, caso contrário ela podia aguar, ficarem enfezados, não se desenvolverem.

É que, para desaguarem as crianças, no caso de ser pão, era preciso ir a nove casas pedir um pouco de fermento, ou de massa que sempre sobrava, para fazer o bolo para lhe dar de comer. O que sobrasse era dado a um cão.

Sobre isto, depressa comecei a fazer perguntas:

“Então, as crianças das cidades, perante uma vitrina com tantos bolos, aguavam todas”?

Nunca obtive resposta satisfatória, digamos.

Também me recordo dos Furúnculos, na zona posterior do pescoço e cuja cura era realizada através de uma mistela coberta com folhas de amieiro.

Por esses tempos, aquilo que muitos – hoje- acham ser um Paraíso o recurso à farmácia ou ao médico só em casos extremos, e nem sempre.

O que se verificou foi que, o aumento dos cuidados de saúde, de uma alimentação melhor, ou de uma maior higiene, caducaram todos esses problemas que, nunca, na verdade, o chegaram a ser. Basta ver o número de crianças que, por esses anos morria, e os de hoje?

 

(José Venade não segue o actual acordo ortográfico em vigor).

 

 

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