Aviões

Por vezes, sinto que o céu me observa.

Talvez esteja a ser um pouco egocêntrico… a enormidade no céu não se poderia focar completamente no meu eu. Se o céu só olhasse para mim, eu teria de ser o centro do céu. Mas o centro não sou eu, é a terra.

Agora que penso, porém, percebo que o céu não tem olhos. Esteja azul ou cinzento, com nuvens ou sem nuvens, ele não vê. Talvez as nuvens sejam os olhos dele. Quando há muitas nuvens num sítio, quer dizer que o céu está a depositar a sua atenção completamente nesse espaço. Quando não há qualquer vestígio de nuvens, então o céu não tem qualquer interesse nesse local.

Frequentemente avisto aviões que rasgam o céu e criam as suas próprias nuvens. Pergunto-me acerca deste fenómeno humano, deveras peculiar. Serão os aviões uma forma de darem mais olhos ao céu? Ele pode ser omnipresente, mas as nuvens não se movem com a velocidade com que eu escrevo cada palavra deste texto.

Agora que olho para o céu, vejo que ele está nublado, mas não demasiado. Nem muito, nem pouco. Mas há lá uma nuvem, sim, uma nuvem, e que enorme e escura ela está! Na minha opinião, se o céu quer controlar e observar as coisas, devia usar agentes menos discretos.

Gostava que ele me pudesse observar a escrever. Se calhar até está. Mas, se não estiver, era bom que ele soubesse que alguém decidiu falar dele nesta tarde tão nublada e observadora. Os humanos gostam muito de pensar neles próprios, é um dom que maior parte de nós tem. Em vez de darmos valor a entidades como este céu tão presente e único, criamos histórias sobre a nossa espécie e falamos acerca da nossa estupidez, inteligência e história.

Enfim, começo a ficar inquieto enquanto penso que estou a ser observado. Oh, e lá vem um avião! Vou-me esconder atrás deste texto.