Joaquim Letria
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Sou o único jornalista do mundo a ter entrevistado o rei das Berlengas, incarnado pelo meu amigo Mário Viegas no filme escrito, realizado e inventado pelo meu querido Artur Semedo.
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Numa tentativa de arrumações, topei hoje com uma velha “cassette” BetaCam em que esse filme — onde eu desempenhava o papel dum intrépido e jovem repórter do Canal 6 da Zona Centro — foi distribuído pelos clubes de vídeo que Deus tem.
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A evolução tecnológica impede-me de momento de rever o filme, pois agora só tenho computadores e leitores de CDroms. Mas o interessante foi ter recordado algumas divertidas peripécias da rodagem desse filme, enquanto relia a capa ilustrada do VHS, e o meu espírito se ter fixado na memória dum episódio histórico que não tem nada a ver com aquilo que tinha em mãos.
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Fiquei a pensar – a ponto de vo-la narrar agora –na história da burra do faroleiro das Berlengas que chegou a constituir um quebra-cabeças para as nossas gloriosas Forças Armadas, fundadoras da Aliança Atlântica, intervenientes na Bósnia Herzegovina, Kosovo, Mediterrâneo, Mar Egeu, Afeganistão, Mali, Líbano, Norte de Itália e Sul de Espanha.
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Contou-me o saudoso almirante Souto Cruz, que fez o favor de ser meu amigo, com o humor contido, elegante e inteligente que o caracterizava, aquele que terá sido o mais embaraçoso momento para ele, enquanto Chefe do Estado Maior da Armada, ele que viria a tornar-se Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, superintendendo ao Comando Conjunto dos Três Ramos e que temíveis assembleias da NATO enfrentara.
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Aconteceu que à vasta secretária que o almirante ocupava no espaçoso gabinete da Avenida das Naus, no então Ministério da Marinha, chegara, acompanhada pelo devido despacho, uma petição do faroleiro das Berlengas e Farilhões solicitando que o respectivo comando procedesse à aquisição duma burra que fizesse companhia ao asno que assegurava o transporte do homem e víveres (com a mulher, em isolamento pelo período dum ano) e que a par de desbastar a erva com que se alimentava, em redor da casa e do farol, garantia as ligações através das escarpas e alcantarilhas que separavam o farol do embarcadouro. Bom de ver que se tratava dum burro estratégico…
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A Marinha, que ainda hoje superintende a esse território da orla marítima, não pensara que um burro não é de pau…e vai daí, o pobre quadrúpede, era frequentemente assaltado pelo desejo carnal e não havia brida, cabeção, rédea ou arreata que o contivesse e o faroleiro via-se grego para o apanhar nas suas fugas galopantes, desesperadas e solitárias, a zurrar pelas escarpas.
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— Agora imagine você se eu despachasse “compre-se uma burra para o burro do faroleiro das Berlengas”, contava-me a rir Souto Cruz que, diplomata como era, lá arranjou maneira de satisfazer os apetites do burro sem se comprometer para sempre com um despacho ridículo.
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Embora este seja um assunto da mais alta esfera da Defesa Nacional, muito gostaria eu de saber o que fazem hoje os almirantes e como vai hoje a vida sexual do burro das Berlengas . É mais importante do que parece! Perguntem ao faroleiro…