Fabula selecionada por Millor Fernandes
Recontada por Antônio J C da Cunha
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A GRUTA DO LEÃO.
IGMAR era um homem que vivia pobre, mas sempre contente de sua pobre vida. Sem dinheiro para comer, sem pão para sustentar os filhos e sem o que dar para a mulher no principio de cada mês. Ele, no entanto , conseguia manter na boca de poucos dentes, um sorriso de paz diante do mundo.
Ia ao super mercado apreciar os amigos fazendo compras. Acompanhava os filhos até a sorveteria para ver os outros meninos pedirem sorvetes e levava a mulher à praia para ver como as outras mulheres eram belas; em seus pequenos maiôs, justos nas partes intimas.
PUBIgmar fazia seu próprio pão, do pão dos outros. Bebia água nos copos alheios e, naturalmente, respirava o livre ar das grandes democracia.
Súbito, como o vento sudoeste que vem do norte, o sopro da prosperidade espantou-lhe os cabelos. Um dia deram-lhe um pacotinho com amendoins . Sentou-se numa esquina para comê-los, mas, antes que o fizesse, alguém passou e arrancou-lhe o pacote da mão e jogou-lhe uma moeda. E Digmar percebeu que tivera lucro. E que o lucro era bom
Igmar comprou vários o pacotes de amendoim e sentou-se na esquina. E lhe tiravam os pacotes e jogavam moedas. E logo Igmar estava sentado na rua com toda a família, coberto de pacotes e cheio de moedas; e logo seu comércio cresceu. E cedo, na mesma esquina, Igmar tinha um supermercado.
Assim são feitos os potentados desta vida. E aí tudo mudou. Mudou Igmar. Mudou a esposa. Os filhos mudaram. Passaram a viver cheios de criados. De necessitados passaram a se preocupar com as contas a pagar. Calçavam sapatos. Usavam meias e tomavam banho. Sentiam o desejo de perfumes. Iam ao cinema e aos teatros. Com muitas relações de amizade. E cada um deixou de cortar seu próprio cabelo, como vinham fazendo durante anos. Passaram a pagar a profissionais especializados chamados barbeiros cabeleireiros. Deixaram de andar a pé. Chamavam o UVER. Passaram a almoçar e jantar fora, em restaurantes. E tudo começou a ser luxo …
Começou a dissolução e a decadência. Igmar passou a perder o contato com os filhos e com a mulher ….
Mas um dia, na hora de dormir, Igmar percebeu que errara o rumo de sua vida. Sentiu que antes era mais feliz, muito mais feliz por não se sentir preso aos grilhões do mundo. Não estando acorrentado às cadeias de ouro do mundo do poder.
Pensou durante alguns dias, e, afinal, num momento raro, em que conseguiu reunir os filhos e a mulher, falou-lhes de seus sentimentos. Para surpresa sua, os filhos e a mulher também pensavam da mesma maneira. Emocionados, choraram um pouco e resolveram agir. E, a partir do dia seguinte, começaram a se desfazer de tudo, jogando o que sobrava pelas janelas. Os jornais noticiaram. Houve escândalo, mas eles de novo se sentiram felizes, na imensa tranquilidade espiritual dos que nada têm, senão o que carregam consigo. E como, naturalmente não podiam voltar à vida antiga, no mesmo local, trataram da mudança. E foram para as montanhas distantes, pois naquele tempo ainda havia montanhas, distantes.
Nas montanhas, depois de alguns dias, à procura de um lugar, descobriram, afinal, uma caverna, e ali, homem que fora bem primitivo, instalou-se contente com a mulher e filhos e netos.
E foram felizes durante uma semana, até que o leão voltou e devorou a todos.
Certamente, o leão era o dono da caverna.
Diz o autor, como moral da história “que só os animais ferozes conseguem manter uma extrema felicidade .
Fábula O Rei dos Animais
Saiu o leão a fazer sua pesquisa estatística, para verificar se ainda era o Rei das Selvas. Os tempos tinham mudado muito, as condições do progresso alterado a psicologia e os métodos de combate das feras, as relações de respeito entre os animais já não eram as mesmas, de modo que seria bom indagar. Não que restasse ao Leão qualquer dúvida quanto à sua realeza. Mas assegurar-se é uma das constantes do espírito humano, e, por extensão, do espírito animal. Ouvir da boca dos outros a consagração do nosso valor, saber o sabido, quando ele nos é favorável, eis um prazer dos deuses. Assim o Leão encontrou o Macaco e perguntou: “Hei, você aí, macaco – quem é o rei dos animais?” O Macaco, surpreendido pelo rugir indagatório, deu um salto de pavor e, quando respondeu, já estava no mais alto galho da mais alta árvore da floresta: “Claro que é você, Leão, claro que é você!”.
Satisfeito, o Leão continuou pela floresta e perguntou ao papagaio: “Currupaco, papagaio. Quem é, segundo seu conceito, o Senhor da Floresta, não é o Leão?” E como aos papagaios não é dado o dom de improvisar, mas apenas o de repetir, lá repetiu o papagaio: “Currupaco… não é o Leão? Não é o Leão? Currupaco, não é o Leão?”.
Cheio de si, prosseguiu o Leão pela floresta em busca de novas afirmações de sua personalidade. Encontrou a coruja e perguntou: “Coruja, não sou eu o maioral da mata?” “Sim, és tu”, disse a coruja. Mas disse de sábia, não de crente. E lá se foi o Leão, mais firme no passo, mais alto de cabeça. Encontrou o tigre. “Tigre, – disse em voz de estentor – eu sou o rei da floresta. Certo?” O tigre rugiu, hesitou, tentou não responder, mas sentiu o barulho do olhar do Leão fixo em si, e disse, rugindo contrafeito: “Sim”. E rugiu ainda mais mal humorado e já arrependido, quando o leão se afastou.
Três quilômetros adiante, numa grande clareira, o Leão encontrou o elefante. Perguntou: “Elefante, quem manda na floresta, quem é Rei, Imperador, Presidente da República, dono e senhor de árvores e de seres, dentro da mata?” O elefante pegou-o pela tromba, deu três voltas com ele pelo ar, atirou-o contra o tronco de uma árvore e desapareceu floresta adentro. O Leão caiu no chão, tonto e ensanguentado, levantou-se lambendo uma das patas, e murmurou: “Que diabo, só porque não sabia a resposta não era preciso ficar tão zangado”.
MORAL DA HISTÓRIA
Cada um tira dos acontecimentos a conclusão que bem entende.
A história nos ensina que não importa quão forte ou poderoso a gente é, sempre pode existir alguém mais forte ou poderoso do que a gente. Além disso, não devemos acreditar em tudo o que as pessoas dizem sobre nós, pois algumas vezes elas podem querer nos agradar ou nos enganar.
É importante ser humilde e saber nossas próprias qualidades e limitações. O Leão da história achava que era o rei da floresta e perguntou para os outros animais se ele era mesmo. Todos disseram que sim, mas quando ele perguntou para o elefante, que era muito forte, o elefante ficou bravo e jogou o Leão longe. Então, o Leão descobriu que nem sempre as coisas são como a gente pensa, e que é importante respeitar os outros animais e saber que todos têm seus próprios talentos e habilidades.
Millôr Fernandes
Fábulas Fabulosas (1964, pág. 23)
Quando a amiga lhe apresentou o garotinho lindo dizendo que era seu filho mais novo, ela não pôde resistir e exclamou: ” Mas como? Seu marido não morreu há cinco anos?” “Sim, é verdade” — respondeu então a outra, cheia daquela compreensão, sabedoria e calor que fazem os seres humanos
— ” Dele morreu, mas eu não”.
MORAL: Não morre a passarada quando morre um pássaro.
Millôr Fernandes
Era uma vez (admitindo-se aqui o tempo como uma realidade palpável, estranho, portanto, à fantasia da história) uma menina, linda e um pouco tola, que se chamava Chapeuzinho Vermelho. (Esses nomes que se usam em substituição do nome próprio chamam-se alcunha ou vulgo). Chapeuzinho Vermelho costumava passear no bosque, colhendo Sinantias, monstruosidade botânica que consiste na soldadura anômala de duas flores vizinhas pelos invólucros ou pelos pecíolos, Mucambés ou Muçambas, planta medicinal da família das Caparidáceas, e brincando aqui e ali com uma Jurueba, da família dos Psitacídeos, que vivem em regiões justafluviais, ou seja, à margem dos rios. Chapeuzinho Vermelho andava, pois, na Floresta, quando lhe aparece um lobo, animal selvagem carnívoro do gênero cão e… (Um parêntesis para os nossos pequenos leitores — o lobo era, presumivelmente, uma figura inexistente criada pelo cérebro superexcitado de Chapeuzinho Vermelho. Tendo que andar na floresta sozinha, – natural seria que, volta e meia, sentindo-se indefesa, tivesse alucinações semelhantes.).
Chapeuzinho Vermelho foi detida pelo lobo que lhe disse: (Outro parêntesis; os animais jamais falaram. Fica explicado aqui que isso é um recurso de fantasia do autor e que o Lobo encarna os sentimentos cruéis do Homem. Esse princípio animista é ascentralíssimo e está em todo o folclore universal.) Disse o Lobo: “Onde vais, linda menina?” Respondeu Chapeuzinho Vermelho: “Vou levar estes doces à minha avozinha que está doente. Atravessarei dunas, montes, cabos, istmos e outros acidentes geográficos e deverei chegar lá às treze e trinta e cinco, ou seja, a uma hora e trinta e cinco minutos da tarde”.
Ouvindo isso o Lobo saiu correndo, estimulado por desejos reprimidos (Freud: “Psychopathology Of Everiday Life”, The Modern Library Inc. N.Y.). Chegando na casa da avozinha ele engoliu-a de uma vez — o que, segundo o conceito materialista de Marx indica uma intenção crítica do autor, estando oculta aí a ideia do capitalismo devorando o proletariado — e ficou esperando, deitado na cama, fantasiado com a roupa da avó.
Passaram-se quinze minutos (diagrama explicando o funcionamento do relógio e seu processo evolutivo através da História). Chapeuzinho Vermelho chegou e não percebeu que o lobo não era sua avó, porque sofria de astigmatismo convergente, que é uma perturbação visual oriunda da curvatura da córnea. Nem percebeu que a voz não era a da avó, porque sofria de Otite, inflamação do ouvido, nem reconheceu nas suas palavras, palavras cheias de má-fé masculina, porque afinal, eis o que ela era mesmo: esquizofrênica, débil mental e paranóica pequenas doenças que dão no cérebro, parte-súpero-anterior do encéfalo. (A tentativa muito comum da mulher ignorar a transformação do Homem é profusamente estudada por Kinsey em “Sexual Behavior in the Human Female”. W. B. Saunders Company, Publishers.) Mas, para salvação de Chapeuzinho Vermelho, apareceram os lenhadores, mataram cuidadosamente o Lobo, depois de verificar a localização da avó através da Roentgenfotografia. E Chapeuzinho Vermelho viveu tranquila 57 anos, que é a média da vida humana segundo Maltus, Thomas Robert, economista inglês nascido em 1766, em Rookew, pequena propriedade de seu pai, que foi grande amigo de Rousseau.
Extraído do livro “Lições de Um Ignorante”, José Álvaro Editor – Rio de Janeiro, 1967, pág. 31
António J. C. da Cunha
- Naturalidade Portuguesa – Freguesia de Geraz do Minho
- Nacionalidade Brasileira – Ministério da Justiça do Brasil
- Cidadão Duquecaxiense – Câmara Municipal Duque de Caxias
- Membro da Academia Duquecaxiense de Letras e Artes
- Associado do Rotary Club Duque de Caxias – Distrito 4571
- Coordenador do Banco de Cadeiras de Rodas do RC Duque de Caxias
- Homenageado com a Medalha Prof. José de Souza Herdy – Fundador da UNIGRANRIO – Universidade Grande Rio
- Integrante Conselho Central da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade
- Cavaleiro Comendador da Ordem dos Cavaleiros de Santo André
- Diretor Proprietário da Distribuidora de Material Escolar Caxias Ltda