D. Afonso III e Valença

Se Dom Sancho I foi o Rei mais luso – galaico, D. Afonso III foi Rei mais minhoto. De facto, sabe-se agora que D. Afonso III, embora tivesse nascido em Coimbra, veio de pequenino para Arcos de Valdevez para ser amamentado por Marinha Martins, cunhada de João Garcia, Chanceler – Mor do reino.

Foi, aliás, este que sabendo D. Afonso II preocupado porque, sua mulher, D. Urraca, não tinha leite para amamentar o filho, lhe indicou a cunhada que acabara de dar – à – luz um menino. D. Afonso veio assim para Arcos de Valdevez, para a quinta de Vilarinho, em S. Salvador dos Arcos, que o Rei lhe coutou. E aí D. Afonso conhece, além de seu irmão colaço, Estêvão Eanes, que foi sempre o seu Chanceler -mor e homem de confiança, e seu irmão, o primo destes João Peres de Aboim, Pedro Martins Casevel, Pedro Martins Vilarinho, Rodrigo Pais de Valadares, Afonso Novais e Pedro Martins Vilarinho. [1] Esta convivialidade manteve-se com o tempo e levá-los-á, mais tarde, ao Conselho do Reino. De resto, em toda a importante documentação nos aparece os nomes de Estêvão Eanes e João Peres de Amorim.

Assim, quando, mais tarde, D. Afonso regressa ao reino, não admira o carinho que tem por estas terras, pois os seus ares agrestes e doces, tinham muitas vezes insuflado os seus jovens pulmões.

Sendo hora de reordenar a defesa da fronteira, ele começa logo por Valença [2] que por aquele então se chamava ainda Contrasta. E a muralha – a de uma forma completa com muros em toda a sua volta e três imponentes torres: uma a norte, outra a nascente e uma terceira a poente, esta a vigiar a longa veiga de Ganfei, que, no séc. XV, se bem as analisarmos [3] , vemos que conservam ainda todas as características desse tempo. E, é claro, dota-a de uma bela casa régia, ainda hoje existente, ainda que mutilada, tal como fizera seu avô, D. Sancho I, sendo que esta muito mais modesta.

Manda reconstruir a antiga igreja de Santo Estêvão e Santa Madalena que passa a ser designada por igreja de Santa Maria, o que foi, quanto a mim, uma forma de distanciar-se do poder do bispado de Tui que por estas terras se viajava como se fosse em terreno de própria coutada.

Depois na hora de dar-lhe Foral impõe a Contrasta o nome de Valença que era o nome de uma terra, também fronteira, no sul de França, onde estivera. [4]  Mas o interessante agora é que isto passa-se não em Agosto de 1262, mas em 1256, como muito bem se vê, confirmando por uma carta régia deste ano, doações por eles (Valença e Monzom) feitas, atribui-lhes já esses nomes. (Chancelaria de D. Afonso III, Liv. I, fol. 19v.o, cfr. Henrique da Gama Barros, História da Administração Pública em Portugal nos Séculos XII a XV, 2ªEdição dirigida por Torquato de Sousa Soares/ Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Tomo II, Lisboa – Livraria Sá da Costa – Editora, pág.39).

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António Matos Reis tem uma explicação para isto. Diz ele que esta “mudança de nome não é um caso isolado na época, nem sequer no Alto Minho. (..) Regista-se, por parte do monarca, a intenção de deixar bem claro o seu poder sobre estes territórios e de afirmar que o novo estatuto correspondia a uma ruptura com o passado,  isto é, com anteriores senhores ou poderes locais, como, pelo contrário o podiam denotar as velhas designações: couto de Mazedo (Monção), couto da Contrasta (Valença), couto da Vinha (Viana)”[5]

Deu-se o caso que, depois de mandar povoar Valença, aliás, Contrasta, “mandavi et feci popular”, e para fixar os povoadores, mandou distribuir por eles e “acoirelar” as herdades do termo e foi então aí que descobriu uma propriedade pertencente ao Convento de Fiães, que os monges se bom grado de prontificaram a trocá-la. Ora, conclui Matos Reis, foram tais acertos que fizeram com que o Foral precisasse de nova outorga “através da qual se chegou à sua versão definitiva”[6]

Nas Inquirições de 1258, 1ª alçada, já se chama Valença a Contrasta: “Item, dixerunt que, quando el Rei Don Sancio Iº deu a poblar esta vila de Contrasta, que agora chamam Valença” (Ibid., Inquit.,I, pag.565).

Portanto, para todos os efeitos, o primeiro Foral de Valença, foi concedido por Dom Afonso III em 1256. Recordo que o Foral de Monção, e segundo também António Matos Reis, tem duas versões:

uma, a mais antiga, encontra-se no primeiro livro de registos da Chancelaria de D. Afonso III, e a outra consta de um pergaminho avulso, que contém o original da versão definitiva.

NOTAS:

 

[1] Leontila Ventura, D. Afonso III, Reis bde Portugal, Circulo de Leitores, p.42;

[2] Comparando com a data das obras do Castelo de Melgaço verifica-se que as obras da fortaleza de Valença são muito anteriores;

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[3] Os baluartes das Lojas (hoje de S. Francisco), da Gaviarra e das Trancas (hoje de Nossa Senhora do Carmo), substituíram os primitivos torreões, pois a finalidade era a mesma: a vigilância doa antiga estrada romana (via IV do XIX Itinerário de Antonino);

[4] O mesmo fez relativamente a Monção e Viana do Castelo. A atribuição do nome a uma terra (“et imposuimus sibi nomen Valentiam”) era uma expressão de poder;

[5] António Matos Reis, Os concelhos da Primeira Dinastia à luz dos forais e outros documentos da Chancelaria Régia, Porto, 2004, Tese de Doutoramento;

[6] Id.

Alberto Pereira de Castro

Major da GNR

(Aposentado)

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