Editorial

Desconfiar cada vez mais
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Joaquim Letria

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Joaquim Letria

Professor Universitário

 

Um recente estudo mostra que os portugueses cada vez acreditam menos nos partidos, aceitam menos as decisões do parlamento e desconfiam mais do Governo. Penso existirem razões claras para que assim aconteça.

Integridade, dedicação à causa pública, capacidade intelectual, tudo isto foi negligenciado e o sucesso público e a fama tornaram-se nos únicos valores que contam, sendo a importância de cada um de nós aferida exclusivamente pela capacidade de ser rico.

Já há muito tempo que os escândalos empresariais mostram o lado negro da economia. A vida económica seguiu um triste rumo que legitima práticas durante décadas consideradas ilegais e moralmente condenáveis.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Seria necessária coragem moral e vontade política para pôr fim a essas práticas consensualmente condenadas. Mas como ter a capacidade de mudar as coisas? Não podemos tornar as pessoas virtuosas, tal como não podemos fazê-las democratas por decisão ou imposição pública. Temos, então, de contar com os nossos professores, os nossos políticos, os nossos comentadores, os nossos media e as nossas famílias para dar exemplos e criar uma base diferente a uma nova abordagem moral. Como se calcula, não é fácil.

É evidente que também enfrentamos uma crise de liderança. O descrédito da economia pública e o fracasso de modelos alternativos geraram políticos longe de estarem à altura de lidarem com os problemas, quando mesmo não são eles a criarem as asneiras dispendiosas e os erros que teremos de pagar e suportar ao longo de anos.

Temos de ter a noção de que esta situação em que vivemos é, em grande parte, o resultado da acção de lóbis poderosos, financeiros, económicos e políticos. Em Portugal e em muitos outros países a prática política não é democrática e o debate económico não é plural.

Não há muita gente com vontade de se recordar que o mercado não existe em estado puro. O mercado é moldado pelas configurações que o definem e lhe dão direcção. A economia e a finança, enquanto instrumentos, podem ser mal usados quando quem está ao leme e o serve tem motivações puramente egoístas. Desta forma, instrumentos que são bons em si mesmos podem ser transformados em ferramentas prejudiciais, como já aprendemos e continuamos a ver acontecer nos nossos dias e diante dos nossos olhos.

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