Editorial

É contra o 25 de Abril?

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Damião Cunha Velho

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Há quem seja contra o 25 de Abril e faz questão de o dizer publicamente.

Acho muito bem que digam o que pensam. Chama-se democracia.

Decorridos 50 anos do 25 de Abril de 1974, ainda há quem tenha saudades da ditadura. Alguns porque desconhecem a história, outros porque viveram sempre em democracia e ainda outros que – os mais ressabiados – no Antigo Regime, nasceram num berço de ouro e de lá para cá caíram do berço. Não, não caíram do berço porque lhes deu um AVC como aconteceu a Salazar quando caiu da cadeira. Simplesmente, porque a democracia diminuiu a clivagem entre ricos e pobres, e muitos que então nasceram num berço de ouro agora não são tão ricos. Nem eles, nem os seus filhos ou netos que agora são, em muitos casos, empregados dos filhos e dos netos dos pobres dessa época. E isto, custa-lhes a engolir.

Esta aproximação entre os que tinham tudo e os que viviam com nada deveu-se à Escola Pública e ao SNS, os dois pilares estruturais de uma sociedade democrática, construídos em Portugal depois de Abril. Conseguiu-se, assim, que ninguém ficasse à nascença com as pernas cortadas, só por ter nascido num meio desfavorecido. A Saúde e a Educação para todos permitiram quebrar um ciclo de pobreza ao colocar no mesmo patamar, ou em patamares mais próximos, ricos e pobres.

O elevador social funcionou e muitos pobres passaram a viver dignamente. Muitos ricos continuaram ricos. Até aqui tudo bem. Aconteceu, no entanto, que muitos filhos de pobres foram mais longe, em termos académicos e profissionais, que muitos dos filhos dos ricos. Aquilo que para estes estava assegurado durante várias gerações, deixou de estar. E não foi porque se criou uma injustiça, mas sim porque se fez justiça. Todos iguais à nascença, os mais competentes, genericamente, conseguiram ter um nível de vida melhor independentemente do berço em que nasceram.

É claro que este processo não correu sempre bem, nem hoje está tudo bem. Porém, é inegável que Portugal está incomparavelmente melhor do que até Abril de 74. Não querendo alongar-me em comparações, basta só olharmos para as taxas de analfabetismo e da mortalidade infantil de então e de agora.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Eu sei que há quem prefira o 25 de Novembro de 1975 como a grande data. Lembro, no entanto, que Novembro é filho de Abril e muitos que fizeram Abril também fizeram Novembro. Por uma mesma razão: não queriam ditaduras, nem de esquerda, nem de direita. Muitos amantes do 25 de Novembro, alguns no armário, outros fora do armário, são saudosistas dos tempos da “outra senhora”. Ou seja, não são democratas, ponto.

Para estes que não gostam do 25 de Abril e que preferiam viver no tempo do Salazar e do cardeal Cerejeira, que agora se manifestam contra a Revolução, para serem coerentes, sugiro-lhes o seguinte:

– Tirem os vossos filhos da escola quando completarem a quarta classe e ponham-nos a trabalhar para sustentar a família;

– À falta de trabalho, à falta de dinheiro para comer, emigrem para França, a salto, e vivam lá nos bidonvilles;

– Se não emigrarem e por aqui ficarem, não se indignem se os vossos filhos trabalharem de sol a sol e receberem não um salário, mas um lanche;

– À falta de conforto em casa, não se queixem porque isso é obra do destino e não de quem vos governa. Se o inverno for frio, acendam umas brasas de carvão em casa. E se alguém vos encontrar a desmaiar intoxicados por monóxido de carbono, não chamem o 112. É que nessa época não existiam bombeiros e socorristas qualificados para vos ajudar;

– Mulheres, se estão a pensar estudar, tirem o cavalinho da chuva porque ser dona de casa é que é ser uma mulher a sério, aquela que preserva a família tradicional. E, se por acaso levarem uns tabefes dos vossos maridos, não se queixem porque faz parte dos costumes;

– Preparem-se para serem torturados, presos ou mortos se ousarem dizer publicamente algo que o regime não aprove…

Poderia estar aqui a dar sugestões sem fim se querem mesmo voltar ao antes do 25 de Abril. Não vou fazê-lo porque quem não sabe como era, que vá ler ou se não gosta de ler que pergunte aos seus avós. Quem sabe e tem saudades desses tempos maravilhosos, não quero torturá-los com mais saudades!

Ou seja, para serem mesmo mesmo coerentes, quando publicamente dizem que são contra o 25 de Abril, deviam estar calados. Afinal, era assim que quem pensava diferente, antes de Abril de 1974, continuava a respirar!

Presumo que respirar é algo que, consensualmente, todos queremos!

4 comentários

  1. Amigo,
    Li, num Editorial de um galardoado, vezes sem conta, jornal escolar, dedicado, também, ao 25 de Abril, que
    50 anos pouco representaram, na nissa vida.
    Concorda ou discorda?
    Só gostava de entender, que se vote, mais, pouco, num candidato, e este seja, constantemente, avaliado.
    Louvo os sindicatos, pela consciência democrática, em esperar por negociações.
    Eles sabem de política.
    Nós, leigos, a começar por mim, que sou de gestão – AP, nada sabemos, de política.
    O amigo, so não é comunista.
    Eu, sou, um pouco, COMUM

  2. Quando “chegou” o 25 de Abril de 1974!
    O 25 de Abril de 1974 chegou com a “revolta dos capitães”
    Os capitães revoltaram-se contra o dr. Marcelo Caetano porquê!
    Digam os Portugueses “qual” foi o motivo da revolta!
    Foi a ditadura?
    Foi a falta da democracia?
    Digam aos Portugueses “qual foi a razão”?
    Digam a verdade!
    Não sabem porque não eram nascidos e a grande maioria, já existia, mas não sabia!
    Uma “pequena” mão cheia sabe!
    Eu quero a democracia, porque lutei por Ela, mas com regras, não “ao gosto” duma pequenina maioria!

  3. Estamos de acordo.
    Eu, não lutei pela democracia.
    Nem apoiei a ditadura.
    Obrigaram-me a vestir uma farda.
    Pão
    Paz.
    Saúde.
    Habitação.
    Conhece esta realida50?

  4. Sim! Conheço essa realidade, mas não passava de um “dito”! Pese embora com a chegada do Marcelo ao Des Governo algumas coisa mudaram, mas “um poucochinho”

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