In memoriam de um Senhor: Edmundo Marques

Sim, este é o texto que nunca gostaria de ter de escrever, e é compreensível que assim o sinta, perdi um Amigo, um Companheiro culto e justo, de envolventes discussões sobre ‘a coisa pública’. Um Senhor que também amava a minha terra, Vila do Conde.

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Edmundo Marques, é dele, e para ele, este ‘In Memoriam’.

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Foi Senhor. Um exemplo de frontalidade, honestidade e respeito pelos outros, e sempre pela Liberdade. Um Homem de Esperança nos outros Homens. A sua cidade berço, Guimarães, perdeu mais um dos seus valoroso e ilustres filhos, Vila do Conde um dos seus mais apaixonados amantes.

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Humanista, ecuménico, democrata, Edmundo Marques acreditava no projecto europeu, que viu nascer, e onde como autarca, foi seu cultor e praticante como membro autarca do Conselho da Europa, um desempenho que lhe valeu uma condecoração do soberano espanhol, D. Juan Carlos.

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Como homem que serviu a ‘coisa e a causa pública’, Edmundo Marques é um exemplo para os vindouros. O testemunho feito pelo actual Presidente da Câmara de Guimarães no final da cerimónia fúnebre religiosa, foi muito mais que um elogio de conterrâneos. – Ele veio de Guimarães à Areia, Vila do Conde, coisa diferente da ausência da Câmara de Vila do Conde, ele que foi membro da Assembleia Municipal, generoso na convivência que sempre dispensou às solicitações endereçadas. – Palavras emocionadas as do autarca vimaranense, em que fez questão de prestar homenagem a um vulto a quem a cidade berço de Portugal, eternamente reconhecida, ainda hoje muito deve. Testemunho público de alguém que conhece, e reconhece, a obra então iniciada por Edmundo Marques enquanto Presidente de Câmara e que tornou possível Guimarães constar actualmente da lista das cidades Património Mundial da Unesco, ser um Polo Universitário, ter deixado planos futuros harmoniosos de desenvolvimento. Palavras de reconhecimento de um percurso de vida, que se Edmundo Marques ainda estivesse entre nós, por certo, com a sua natural humildade diria, ‘é um exagero’, ‘apenas cumpri, ouvindo’. A sua honestidade e frontalidade eram, foram, sempre proverbiais. O que naturalmente incomodava muita gente.

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Sempre com os olhos no futuro, Edmundo Marques tinha para com a educação uma especial aposta e empenho. E foi com a educação, a cultura, o património que como autarca ganhou direito a público reconhecimento entre os seus conterrâneos. Assim, em 2015, foi lhe atribuída a Medalha de Honra do Município, galardão atribuído ‘em sinal de reconhecimento pela ação interventiva e fundamental no desenvolvimento do concelho’, atestando e louvando desse modo o trabalho desenvolvido por Edmundo Marques, um dos primeiros autarcas a apostar na educação como elevador social. A aquisição do Palácio de Vila Flor para as instalações provisórias da Universidade do Minho, foi decisiva para a concretização de Guimarães como cidade universitária, num tempo em que a localização de todos os cursos era em Braga. Visionário, a ele se deve o valoroso acervo histórico arquitectatónico e urbanístico de que Guimarães tanto se orgulha. Se é hoje possível admirar e desfrutar deste património admirável no casco urbano da cidade, esse é um legado que foi iniciativa sua, já que foi ele que pediu a contribuição do arquitecto Fernando Távora, e de um conhecido fotografo local para que o processo arrancasse e fosse uma realidade. Um, inventariando e definindo as regras, o outro, preservando em imagem o que então existia, para que os vindouros a conhecessem. É esse Património/memória a que o conhecimento e gosto o arquitecto que soube dar interpretação e tradução que ainda hoje perdura na urbe da cidade berço.

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Edmundo António Ribeiro Marques de Campos de seu nome completo, teve o seu baptismo como autarca ao presidir à Comissão Administrativa que conduziu a Câmara Guimarães até à primeira eleição democrática para o Poder Local no pós-vinte e cinco de Abril de 1974, a que concorreu como candidato socialista, que venceu e dirigiu como eleito, de 1977 a 1979, retirando-se depois para a sua anterior actividade, gerente bancário, uma atitude nunca bem digerida pelas ‘estruturas partidárias’ então já a posicionarem-se para fazer carreira por via da politica. Mas apesar de tudo, a sua casa foi sempre o local privilegiado e porto seguro para muitos, de diferentes quadrantes, e aspirantes a distintos lugares, que ali iam buscar opiniões e aconselhamento, quando não, até ajuda. E se privou e era confidente de eminentes figuras da nossa vida pública nacional, foi também um dos intervenientes a Norte, da contenção dos desmandos de Novembro de 1975, a Sul.

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Afastado da tortuosa vida politica/partidária, de que excepcionalmente condescendeu, aceitando fazer parte como candidato a membro da Assembleia Municipal de Vila do Conde, integrando a lista da NAU no seu primeiro embate eleitoral, vivia a vida como só o podem e sabem fazer os homens justos, realizados. O seu amor por Vila do Conde ‘obrigou-o’, ao pesado sacrifício de voltar a fazer politica, mas Vila do Conde, voltou a reincidir em não entender quem nada pedia em troca. E a ignorância aliada à desconfiança, dá no que sempre dá, mesquinhês e inveja. A sua já antiga ligação à terra de José Régio, onde ainda jovem frequentou um colégio, criou raízes e amizades que ainda hoje perduram, que muito gostava e animava. Quando mais tarde foi dos primeiros vimaranenses a fazer da praia das Caxinas ponto obrigatório de estadia nas férias, mais rendido ficou à Princesa do Ave, às suas tradições, costumes e gentios.

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Requisitado com convites para colaborar em diversos meios de Comunicação Social, quer escrita, quer falada, Edmundo Marques, pelo seu conhecimento, a sua experiência de vida, a sua visão da ‘coisa pública’, alargada, diversa e diversificada, tornava as suas intervenções e participações cívicas em lições sensatas, equilibradas e humanistas, mostrando-o como Homem livre, probo, honrado e estruturalmente honesto. Livre pensador, cultivava a sensibilidade humanista que só os Senhores emanam, partilhando conhecimento e cultura. Aliás, marcas que deixou indeléveis no exercício e vivência de cidadão, profissional, político, autarca, e defensor da Liberdade. Liberdade, esse desiderato, que não era um estado de alma de momento, mas uma preocupação com o futuro, que acreditava poder ser melhor que o presente. Aliás, a maioria dos seus textos escritos mostram essa preocupação, e o legado autárquico confirmam.

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Guimarães perdeu um dos seus mais eminentes filhos. Vila do Conde um dos seus apaixonados. Eu um dilecto e querido Amigo. A Madalena, sua esposa, um carinhoso companheiro.

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Partiu para a eternidade Edmundo Marques. Não mais o mar e vento o cumprimentará. Mas a foz da Ave guardará para sempre as suas cinzas… com a Senhora da Guia mar a dentro.

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