Olha-me e sorri. Explica-me todos os pormenores com muito cuidado.
Diz-me o que devo fazer. Estás a perceber? Não preciso de responder. Continua. E eu perdido a olhar, e sinceramente sei que vou demorar a perceber aquelas mãos, ela a deitar mais um pouco de sal, ou gengibre, e diz que também podia usar cravinho da Índia.
Mexe-se apressadamente. Parece que os pensamentos lhe vêm de forma atribulada. Mas resultam. Os sabores que ela cria são incomparáveis. E continua a mexer-se, a pensar. Acrescenta ingredientes como se se tivesse esquecido de os colocar. Parece que os mete para inventar, como se fosse a sua primeira vez e não tivesse quaisquer expectativas.
Podemos cozer primeiro, diz ela. Lembrou-se que na panela de pressão era melhor. Ou talvez até coloque no forno. Não, é melhor não, fica para outra altura.
Os odores antecedem o sabor. Observo a sua leveza no que faz, e prevejo a doçura dos feijões, o tempero dos bifes que ela cozinha.
E os cheiros aromatizam a cozinha, tudo fica encantando naquele espaço, uma sabedoria única de quem dedicou uma parte da vida a sabores, ao amor de cozinhar imensos pratos, de fazer todos felizes em seu redor, juntar todos numa mesa, e ela sempre a dizer que fez de uma forma, que que se fizesse de outra os sabores seriam diferentes.
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Relembro debilmente os seus pastéis e chamuças que tanto me alegram as refeições. Se prefiro algum deles, é difícil dizer. Os dois têm a sua essência. Essências que ela própria concebe no seu tempo, no seu cozinhar apressado e leve.
E porque nunca abriste um restaurante? E ela sorri, a Nóno dos cabelos louros, e não são pintados, e deita cair uma semente de cardamomo no arroz, diz que está a ficar pronto. Vejo que sente falta do avô, que cozinhava de uma forma mais relaxada e inteira, sem se apressar no tempo. Prepara a mesa, todos nos sentamos e o tempo estagna. Tudo tão perfeito…