O carro vermelho

Num deserto árido em que o sol observava tudo em redor, um carro seguia sempre em frente num trilho de terra batida.

O trilho era infinito, e o percurso do veículo parecia também ser. Não tinha condutor, mas o vermelho poeirento que o carro levantava parecia ter algum objetivo em concreto.

Ia a uma velocidade agitada, suficiente para deixar grandes e densas nuvens de pó que pareciam imperturbáveis no deserto. Pareciam ficar cada vez maiores e mais densas até que se tornaram quase que surreais. Nenhum carro poderia deixar nuvens de tal enormidade.

As nuvens eram tão densas que tapavam rochedos e arbustos solitários. Mas nada disto parava o carro. O seu percurso, por mais reto que fosse, parecia já definido. Não havia quaisquer intenções para parar.

Quando as nuvens, longínquas, finalmente dissiparam, o deserto já não parecia deserto. Havia uma enorme quantidade de lixo que cobria o chão. Havia de tudo e, ao longe, visto de cima, o lixo coloria o espaço, parecia fazer uma tela de cores sem nexo que irradiavam um cheiro que obrigavam as nuvens a afastarem-se.

Porém, nada disto parava o veículo que continuava a lançar poeira e a fazer lixo no chão. Ou estaria o lixo ali escondido? Pois não fazia sentido ele aparecer assim do nada, e com tal quantidade.

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O carro continuou a acelerar e a deixar ainda mais poeira. As nuvens eram tão grandes que chegaram ao sol. Acreditem quando digo isto, pois sou uma nuvem no céu e vi o sol a ser tapado pela poeira. Quando ela dissipou, já não havia sol, já não havia deserto, somente lixo e lixo que, do alto, criava uma floresta única de tonalidades. O carro? Perdi o carro, essa ideia de que sem pressa não temos futuro, sem parar não continuaremos, sem seguir em frente nada criamos.

Perdi o carro, pois tenho de parar num percurso para imaginar nuvens e outros céus. Tenho de parar para ver outras tonalidades de luz e perceber que esta pressa somente levanta o vazio.

A viatura, de certeza, continua a criar poeira e lixo e revela um solo podre e sem vida. As nuvens e o sol podem ser falsos. A luz que existe durante a noite é feita por nós e, por isso, nós a rodar em volta da luz, temos um planeta todos os dias mais escuro, sombrio, artificial. Mesmo sendo nuvem, e o vento me possa levar, parece-me que a nossa vida desaparece na artificialidade por não ter coração e a energia do sorriso.

 

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2 comentários

  1. Parabéns, Daniel! Cada crónica tua tem algo que nos faz refletir e olharmos para dentro do nosso interior ou o que nos rodeia. Pensamento crítico e de acordo com a actualidade. Bem hajas e aguardo a próxima e partilho sempre com grande orgulho por seres um jovem desta geração que escreve, lê e reflete! Agradece os teus professores e educadores e à tua escol que está a formar-te e deve agarrar isso com grande orgulho. Só pode ser bom aluno e progredir para teres um futuro que dê alguma esperança neste país. Boa sorte!

  2. Olá Daniel este texto agradou me muito, obriga a reflexão e só posso dizer que é maravilhoso como escreves o texto

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