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‘O PS está hoje capturado e existe medo’ – acusa ex-dirigente de Ponte da Barca

José Pedro Amaral

Tem apenas 27 anos mas assume-se claramente como um dos “críticos” do caminho seguido pela direcção do PS. Amigo de António José Seguro, foi o membro mais novo da Comissão Nacional escolhido pelo anterior líder.

No distrito e no seu concelho tem assumido como um papel junto dos que diz “pensarem de modo diferente”. Chama-se José Pedro Amaral e o MD foi entrevistá-lo.

«BASTA PERCEBER PORQUE NÃO HÁ REUNIÕES»

Minho Digital (MD) – De entre os socialistas, tem sido uma voz crítica, a nível distrital nas redes sociais no que concerne ao governo socialista. Como é que de repente se vê na posição de estar praticamente sozinho a dizer mal do governo?

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José Pedro Amaral (JPA) – Habituei-me a estar no PS de forma livre e a dizer o que penso. Existe muita gente no PS que concorda com muitas coisas que tenho dito. O problema é que existe medo dentro do PS. Agora não me peçam para não dizer aquilo que penso. Tenho apenas 27 anos, 9 de militância activa no interior do partido e, no passado, pelo facto do PS estar no governo, não dissemos aquilo que pensávamos e aconteceu o que aconteceu, nomeadamente a necessidade de haver um resgate. 

Basta perceber a razão pela qual não têm existido reuniões no partido, nomeadamente a nível nacional e distrital, razão que o PS está hoje capturado pela cúpula que está no poder. Eu gostaria de dizer o que digo cá fora nas reuniões do partido. Mas não existem!

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

MD- Falou em medo dentro do PS. Mas têm medo de quê? De perder o emprego?

JPA- Não vou falar de casos específicos, mas existem. Como sabemos, instalou-se na sociedade portuguesa e nas instituições, nos últimos anos, o culto do poder, sendo este exercido com arrogância e ameaça impedindo ter opiniões contraditórias. O PS infelizmente não é excepção, “quem não é por mim é contra mim”. E existem casos mais do que evidentes. Têm medo de várias coisas. No PS haver uma lista alternativa é um drama, porque é muito mais difícil fazer uma lista ordenada por ordem alfabética do que ter uma ordem em função da expectativa de poder e ter todo o pensamento condicionado num só sentido. 

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Este é um drama que o Partido Socialista tem que resolver porque dificilmente um partido com estes tiques interamente pouco democráticos estará em condições para poder ter uma atitude muito diferente em termos da sociedade e de governação do país.

Todos percebemos que a nível nacional tudo começou há dois anos. António Costa desafiou António José Seguro, candidatou-se ao congresso, depois das primárias e ganhou. Depois perdeu as eleições e, mesmo assim formou a “geringonça”. Não seria normal haver paz interna?

MD – Que lhe parece?

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JPA – Seria normal haver paz interna, sim. Mas isso é para quem não está na política obcecado com o poder e desmedido do mesmo. Eu e aqueles que pensam de modo diferente, não! Quando o António Costa abriu uma crise sem precedentes na história do partido desafiando um líder vencedor, que venceu três eleições, que recuperou um partido de uma tragédia eleitoral tinha dois objectivos: vencer as eleições com maioria e unir o partido. Nem uma nem outra conseguiu.

A nós, que estamos na política e que não dependemos dela, não nos interessa chegar ao poder … pelo poder! Não vale tudo! 

O PS perdeu as eleições, sofreu uma grande derrota eleitoral. O que seria lógico era o partido escolher um novo líder, liderar uma oposição responsável e, hoje, talvez pudesse liderar um novo movimento igual àquele que liderámos quando em 2011 o António José Seguro venceu as eleições internas. 

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«EPISÓDIOS DE TELENOVELA» DA «GERINGONÇA»

MD – Acusa o atual primeiro-ministro de estar a transformar o PS num partido cada vez mais sectário…

JPA – O partido não é sectário, os dirigentes que estão à frente do partido é que têm comportamentos sectários. Não nos podemos agora esquecer pelo simples facto de estarmos no Governo do que se passou e da forma como lá chegamos. O país precisa de discussão sobre assuntos determinantes na vida dos portugueses. Não vou negar que é preciso e era urgente repor alguns rendimentos e isso já estava previsto e as reformas? Que reformas estruturais estão a ser idealizadas? Que plano a longo prazo tem o Governo para áreas fundamentais na vida dos portugueses? 

Como é possível, ao fim de um ano numa constante permanência em campanha eleitoral haver medidas como uma norma do Ministério da Saúde a não dar autorizações para mais despesas?

MD – Já escreveu nas redes sociais que o Governo está a falhar nas contas…

JPA – É manifesto! Olhamos para os dados da economia e há muita coisa que não bate certo. Apesar do discurso político, a economia não está a mexer no que devia. Alguns instrumentos de intervenção directa estão muito condicionados, nomeadamente os fundos comunitários. Apesar do esforço, ainda não se conseguiu deslindar o novelo de maneira a colocar dinheiro na economia.

MD – Em que outras matérias achas que o Governo errou?

JPA – O país não pode ser um banco de ensaios de experiências governativas.

Uma das primeiras medidas do Governo foi a reversão do processo de privatização dos transportes da STCP, do Metro do Porto e da Carris/Metro de Lisboa, com manifestos impactos na confiança dos investidores estrangeiros e com a expetativa de reforço da qualidade do serviço público prestado aos utentes. Puro engano!… 

A questão do IMI, das incertezas e das falhas de comunicação do Governo relativo ao suposto novo resgate. 

MD – Mas são questões que foram ultrapassadas pela “geringonça”…

JPA – O problema dos portugueses não se esgota com a resolução dos seus sucessivos episódios de manutenção ou não do apoio parlamentar ao Governo. Isso são episódios de telenovelas…

O problema, para além das questões expostas, é o desplante de se prometer devolver a sobretaxa aos portugueses e, ao mesmo tempo que não se cumpre atribuir ao Presidente da CGD 423 mil euros É o desplante de termos tido prometido reverter a fusão e extinção das freguesias e, até hoje, nada termos feito, entre outros exemplos que descredibiliza e delapida o património do PS.

«EXISTE GENTE CONDICIONADA»

MD – Autárquicas 2017. O PS é o maior partido português, com 150 Câmaras, incluindo a de Ponte da Barca. Quais as expectativas?

JPA – As expectativas será no reforço do número de Câmaras, naturalmente com a manutenção da autarquia de Ponte da Barca. Não faria sentido pensarmos de outra forma. Mas as autárquicas decorrem noutro cenário. O PS não está unido. O PS de Ponte da Barca, tal como outros partidos e outras estruturas é constituído por pessoas que pensam de maneira diferente sobre situações diferentes. Por isso é plural.

MD – Apesar do medo que referiu?

JPA – Sim, existe medo no PS. Existe gente condicionada, mas existe gente que dá a cara, que pensa de modo diferente, que não tem medo, que defende uma alternativa, que tem bases dessa mesma alternativa. Não podemos permitir que pessoas que tanto deram de si no passado, sejam hoje marginalizadas…

MD -Quer concretizar?

JPA – A falta de debate interno no partido, a forma como são tratados camaradas que tanto deram, deveriam  envergonhar quem hoje lidera. Eu olho para militantes como o Zé Braga, o Alberto Cerqueira, o Zé Luís Fernandes, entre muitos outros, que tanto deram e hoje deveriam ser ouvidos. Eu tenho muito orgulho em camaradas como esses, com quem falo regularmente.

Este não é o partido da Maria Júlia e do Tózé Dias. Hoje o PS está capturado pelo poder. Faltam estas vozes firmes, de liderança que sabiam o que era difícil ser do PS.

MD -O José Pedro foi um dos dirigentes do partido mais ativo localmente. Hoje mais distante, o que mudou?

JPA – Sempre estive disponível para o meu partido. Sempre fui dos dirigentes locais mais ativos. Mesmo não concordando com alguma estratégia seguida fui fiel e leal e expus dentro do partido, quando me deixavam, as discordâncias que tive.

MD -Quais? Porque nunca as disse cá fora?

JPA – Desde logo em 2005 quando firmámos um acordo político com o CDS/PP. Sou e continuo a ser frontalmente contra. Um acordo que não trouxe vantagens eleitorais e de governação ao PS. Apenas serviu para alguns…

MD – Pode concretizar?

JPA – Está mais do que evidente. Existem acordos que muitos de nós não conhecemos. O acordo com o CDS é desastroso. 

Mas não só!… Eu tenho muito orgulho no passado do PS. Eu vivi o PS desde muito novo, onde despoletava uma liderança que sabia honrar o património do PS, como era o caso do eterno António José Dias. Tenho a certeza que tinha qualidades para ter sido o melhor Presidente da Câmara que o concelho poderia ter tido algum dia. 

MD – Porque só falou agora?

JPA – Falei agora aqui fora. É do conhecimento de todos que não concordei com a estratégia seguida. Mas não só! A minha principal divergência prende-se, não com os aspetos da governação – apesar de crítico de alguns deles – mas essencialmente como o partido foi capturado pelo poder municipal. A transição do segundo para o terceiro mandato foi desastrosa, desde logo a saída do Manuel Joaquim implicou um desvio forte na orientação do executivo municipal, tornando-o absolutamente monocéfalo. Na minha opinião estamos na altura certa para mudar de página.

Temos de, na vida política, de fazer investimento, de promoção da nossa Terra. Temos de eliminar, definitivamente, o “Eu, Eu, Eu” e passar para o “Nós, Nós, Nós”.

MD – Depreendo das suas palavras que existem aspectos da governação que não concorda?

JPA – Sim, como tudo na vida não concordamos com tudo. No global, a avaliação é positiva, mas a forma como a fazemos, deixa muito a desejar na maior parte das vezes. Não existe ligação com o partido, não posso admitir que desprezemos e deixemos ao abandono os autarcas das freguesias. São o melhor património que temos. Eles precisam de ser chamados e ouvidos, e são essenciais na estratégia a seguir. É urgente dignificar e envolver nas questões centrais da governação.

«JOSÉ PONTES É O MEU CANDIDATO»

MD – Vassalo Abreu, em entrevista recente afirmou que as divergências eram relacionadas com as primárias…

JPA – São afirmações que respeito mas, na verdade, não tenho a mesma opinião. Em 2011 houve duas listas em Ponte da Barca para o Congresso Nacional. E já aí houve divergências. Nós, apoiantes de António José Seguro ganhámos em 2011, vencemos ainda as primárias abertas a todos, em 2014! E o atual Presidente da Câmara estava do outro lado… 

MD – E isso não os fez pensar numa alternativa já nessa altura?

JPA – Nós sabemos respeitar e avaliar a situação. A verdade é que os camaradas que venceram em Ponte da Barca, souberam respeitar outro tipo de decisões. Sou crítico, mas nunca colocamos em causa a candidatura à Câmara, em 2013, que aliás defendemos para dar continuidade aos dois mandatos anteriores, que em minha opinião foram quase excelentes!

MD – Alguma vez pensaram nisso?

JPA –Como lhe disse, nós sabemos respeitar. Ganhámos, mas o projeto do concelho é maior que todos. E nós estivemos lá. Nunca nos recusaámos. Aliás, se verificar, basta ver quem preparou os processos eleitorais!

MD – José Pontes, homem da sua confiança, não esconde o desejo de ser candidato à CM. Que comentário faz?

JPA – O Eng. José Pontes tem um percurso profissional e político que falam por si. Mal seria que com uma disponibilidade dessas o PS não aproveite um quadro com esta qualidade.

MD – É o seu candidato?

JPA – Não poderia ser de outra maneira. É o mais bem preparado que o PS tem nos seus quadros.

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