João Ribeiro
(Jornalista)
Quando em Outubro os portugueses foram chamados às urnas, em Viana do Castelo registou-se uma abstenção de 49.3%. Um pouco por todo o país, a grande vencedora de uma eleição que não teve vencedores nem derrotados, acabou por ser a franja abstencionista, que há muito se tornou num mal que põe em causa o equilíbrio democrático.
Com o Natal à porta, o país vê-se preso entre duas eleições que certamente trarão alterações na volátil dinâmica política portuguesa. Se as legislativas de Outubro deram uma vitória fraca à PaF, que acabou por cair, e acabou com Costa a liderar um governo inédito com apoio parlamentar da esquerda, Portugal prepara-se já para as Presidenciais de Janeiro que, mais de 20 anos depois, terão o condão de retirar Cavaco Silva do activo da cena política nacional. Importante, portanto, reflectir sobre os números da abstenção, que prometem escalar nas Presidenciais e que atingem recordes absolutos na ida a votos para o Parlamento Europeu. Curioso, importa sublinhar, notar que as eleições mais importantes para o país são exactamente aquelas que mais consequências directas nos trazem. Um Portugal que há muito cedeu a sua soberania para a federação europeia, de uma forma consentida, vê as eleições de deputados para essa mesma federação serem alvo de um desinteresse cabal, mas incompreensível, dada o poder quase imensurável e supranacional da União Europeia.
Mais do que uma possível descrença nas instituições democráticas, os níveis de abstenção são registados essencialmente numa franja jovem da sociedade, com uma idade compreendida entre os 18 e os 40 anos, que se abstém desde que atinge a idade mínima legal para votar. Todos esses, os «abstencionistas crónicos», serão já dificilmente mobilizáveis para as urnas, formando uma grande maioria não votante, em contraste com um minoria que decide o destino de uma sociedade inteira. Consoante a sociedade vai envelhecendo, entra-se numa espiral abstencionista que põe em causa o equilíbrio democrático, bem como inclusive a sua sustentabilidade como sistema político a vigorar nas próximas décadas. É provável que em poucos anos, quando os níveis de abstenção escalarem para valores a rondar os 70%, o mundo ocidental enfrente uma crise de sustentabilidade democrática, que faça repensar os pilares que baseiam o desenvolvimento e que sustentam o rumo político-social em vigor. E quando isso acontecer, de uma forma paradoxal, aqueles que em Janeiro sucumbirão ao conforto do sofá, prescindindo do voto na urna, irão clamar pela oportunidade de ter uma palavra a dizer.
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