Editorial

Os Gloriosos Estádios Portugueses
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Joaquim Letria

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Joaquim Letria

Professor Universitário

A rádio que ouvi num táxi falava, entusiasmada, no facto da Câmara Municipal de Braga ter as contas bancárias congeladas por dívidas por pagar. Pelo que percebi, e de acordo com uma breve entrevista transmitida com o actual Presidente da Câmara de Braga, o calote prende-se com a obra monumental do Estádio da Pedreira, cuja concepção ainda não há muito tempo o arquitecto Souto de Moura se queixava de não ter recebido. Agora vão perguntar aos bracarenses se querem vender o estádio, possivelmente aos galegos…

Claro que o presidente da Câmara de Braga teve o cuidado de dizer, na referida entrevista radiofónica, que a responsabilidade da situação era do seu antecessor, ao mesmo tempo que sublinhava que o pessoal que agora trabalha na Câmara podia estar descansado quanto ao recebimento dos respectivos salários, a tempo e horas, pois esta triste situação não tinha como correspondência um “government shut down” à Trump. Já os fornecedores, explicava o presidente, teriam de ter ainda mais um bocadinho de paciência para receberem o devido.

No meio da trepidação do táxi lisboeta que me transportava e a conversa do motorista que se não calava, percebi então que a entrevista radiofónica tinha seguido para a macro economia, com um interessante diálogo ao nível da alta finança em que se explicava como o estádio em questão, cujo orçamento rondaria a quantia de 65 milhões de euros, teria resvalado para o número actual de 170 milhões de euros, o que na conversa era atribuído a uma derrapagem que, aliás, o presidente da Câmara previra em textos oportunamente escritos acerca de imparidades.

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Saí do táxi, deixei que os órgãos do corpo humano regressassem às suas naturais posições, esperei que o apito nos ouvidos se recompusesse e fiquei a matutar. Não só no que acabara de ouvir como também numa interessante palestra dum professor universitário alemão que se pronunciou, com elegância, acerca da passividade dos portugueses, atribuindo-a à falta de educação, à precariedade, às condições de vida, aos baixos salários e à necessidade do duplo emprego.

Pensei como é possível até hoje ninguém ter reagido ao escândalo da construção dos dez estádios de futebol para serem palco praticamente de um jogo cada um, alegadamente para o campeonato da Europa, os quais custariam ao todo mais de 600 milhões de euros para estarem hoje devolutos e alguns a apodrecer. E ninguém disse nada à pouca vergonha de construírem três estádios desses a menos de 60 quilómetros de distância entre cada um deles – Coimbra, Aveiro e Leiria. Que bonzinhos que os portugueses são…

Não só ninguém reagiu como ninguém foi preso. Enfim, depois da Expo, esta foi a grande obra portuguesa do actual secretário-geral das Nações Unidas, em cujo governo estagiou a equipa dos ministros  de Sócrates afim de se preparar para os dias de hoje.

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