Editorial

Pequenas notícias
Joaquim Letria

Joaquim Letria

Em tempos ouvi um director de jornal dizer na TV que directores e editores não têm hoje tempo para “notícias pequenas”.

Que me perdoe, mas não posso estar mais em desacordo. Compreendo o que quer dizer, mas esquece-se que desde sempre as noticias verdadeiramente importantes começam por ser publicadas em meia dúzia de linhas e, muitas vezes, em páginas secundárias.

É em meia dúzia de linhas que ficamos a saber indícios do que o crime organizado se prepara para fazer. É em pequenas notícias que descobrimos as cumplicidades e as grandes corrupções, é cruzando a leitura duma local com as declarações dum político ou as revelações discretas dum empresário que melhor sabemos em que mundo vivemos.

Recordo-me de há anos atrás, quando eu era um simples repórter e se falava do êxodo dos grandes lagos, haver uma notícia de duas linhas no Liberation de Paris contra Kabila e o Guardian de Inglaterra falava em “movimentações dos herdeiros dos Katangueses refugiados em Angola”, enquanto o  Die Welt de Hamburgo dava conta da contratação de mercenários ingleses, americanos, belgas e croatas para combaterem pelos “rebeldes zairenses”.

Só mês e meio depois destas notícias os ingleses escreviam duas linhas referindo a ajuda de Savimbi a Mobutu, enquanto igualmente pequenas notícias falavam de “escalas técnicas” dos dois em Rabat. Então, a visita de Hassan II a Washington e a do príncipe herdeiro a Madrid não tiveram igualmente mais de quatro linhas. Vejam lá a importância daquelas pequenas notícias.

Não concordo com aquele director de jornal. As grandes notícias começam muito antes das coisas grandes acontecerem  e começam sempre por uma notícia pequena. As manchetes para vender são outro negócio, hoje em dia.

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