Vitor Bandeira
Inspector-chefe aposentado da Polícia Judiciária
Remonta talvez a 12 de Fevereiro de 2006, a primeira detenção de terroristas ligados ao Estado Islâmico efectuada em Portugal.
Os factos passaram-se quando um homem que se preparava para embarcar para Cabo Verde, foi detido pela PJ. No acto da detenção tal individuo ainda tentou reagir, mas verificou que não tinha condições para disparar e entregou-se sem problemas.
A detenção ocorreu na Zona da Amadora e com ele foi detido outro indivíduo do sexo masculino. Esta detenção foi efectuada na sequência de uma outra efectuada na semana anterior. Foram assim três os detidos na altura.
Os três detidos eram cidadãos holandeses de origem cabo-verdiana e o seu destino seria Cabo Verde que pretendiam alcançar para fugir ao mandado de captura Europeu existente. Note-se que Cabo Verde não extradita cidadãos do seu país.
A confirmação da ligação destes elementos ao Daesh, surgiu depois, por intermédio do porta-voz da Procuradoria Holandesa Desirée Lepens .
Mas já em 2002 Portugal tinha estado em território nacional Bem Yamin , um dos homens envolvidos na célebre tentativa de atentado com rícino em Londres. Também em 2004 havia estado entre nós Nourideme el-Fathmi , jiadista próximo da célula terrorista holandesa responsável pela morte de Theo van Gogh, realizador de cinema. http://www.minhodigital.com/news/terrorista-foi-%E2%80%98h%C3%B3spede%E2%80%99-em-mon%C3%A7%C3%A3o
Recordamos que também em 2008 foi noticiado que 14 alegados membros de uma célula terrorista desmantelada em Barcelona, ligados ao grupo Talib Jamat, tinham estado em Portugal entre 2006 e 2007. Este grupo detectado e detido pelas autoridades espanholas, teria como objectivo fazer-se explodir no metro de Barcelona.
Mas voltemos à actualidade e sabemos que Mohamed Emwazi, quando ainda não era o temido Jihadi Jonh, executor de reféns, mas já ocupava um lugar de destaque nas células extremistas britânicas, passou por Portugal em 2011, acompanhado por outros dois extremistas ex-prisioneiros de Guantánamo, por terem combatido ao lado da Al-Qaeda no Afeganistão.
O grupo deslocou-se de carro de Inglaterra a Portugal com o fim de angariar fundos para o Daesh. Tais fundos seriam angariados junto de um elemento, também estrangeiro, de passagem por Portugal , que havia feito parte de uma milícia que combatera Bashar al Assad e tinha sido detido na Siria.
Os encontros, segundo consta, teriam ocorrido no Verão de 2011, não tendo na altura passado despercebido às autoridades portuguesas, que monitorizaram os passos do grupo.
Tanto o cidadão estrangeiro que os recebeu, como os dois homens de Guantánamo, estavam sob especial vigilância por parte das forças de segurança. Já Emwazi era um desconhecido para as forças de segurança portuguesas, embora fosse seguido de perto pelo MI5.
Sabe-se ainda que a pressão exercida pelas autoridades portuguesas sobre o grupo, fez abortar a angariação de fundos.
Sabe-se agora, também e segundo o jornalista ingles Robert Verkaik, autor da primeira biografia sobre Jihad Jonh “The Marking of Terrorist”, que as secretas portuguesas, por intermédio do “homem de Lisboa” se reuniram com o grupo, tendo ao encontro comparecido pelo lado português três oficiais. O encontro terá tido a duração de cerca de três horas e o grupo terá convencido as autoridades portuguesas que não estariam em Portugal a planear actos violentos e que apenas aqui se encontravam meramente de passagem. Após o encontro consta que o grupo regressou aos seus países de origem.
As autoridades portuguesas desmentem esta versão dos factos, não negando no entanto a passagem do grupo por Portugal.
Um ano após este episódio Emwazi conseguiu iludir os Serviços contra terrorismo ingleses e viajar para a Siria, donde se viria a transformar no inimigo número um do Ocidente entre 2014 e 2015.
Emwazi ou Jihadi Jonh, acabou por ser abatido em 12 de Novembro num ataque aéreo cirúrgico dos EUA.
Recordamos que Jihadi Jonh era próximo do grupo de jiadistas portugueses radicalizados nos arredores de Londres e ter-se-ão conhecido na capital inglesa ou talvez já em Raqqa. Não existe qualquer elemento que ligue a estadia do “rapaz da propaganda” em Portugal àqueles jiadistas portugueses.
Pergunta-se: existe ou não perigo de ataques em Portugal?
Especialistas na matéria dizem que ataques a Portugal e Espanha poderão ter lugar numa perspectiva de “reconquista” por parte do califado da denominada al-Andaluz, isto porque a perda da al-Andaluz é um dos pontos de inflexão que marca o domínio da civilização islâmica, que o daesh agora quer reconquistar.
Assim a sua reconquista é essencial para o dealbar do califado mundial. No entanto esta não será uma prioridade imediata para o daesh, que acentuará a sua estratégia em ataques pontuais e estratégicos que obtenham grande impacto mediático.
Segundo ainda a opinião de especialistas em terrorismo e contra terrorismo, o daesh terá sofrido ultimamente grandes reveses operacionais que se traduziram também na quebra de influência e receitas, havendo notícias de que a organização está fraca depois de anunciar cortes salariais aos jiadistas e de aumentar a pressão na cobrança de impostos sobre a população que mantém refém.
De acordo com a informação disponível, poderemos considerar que estes problemas têm efeitos lesivos, no entanto para contrariar esta imagem de debilidade que resulta dos problemas que enfrenta, o daesh pode aumentar o seu empenho em cometer atentados na Europa, o que vai de encontro ao Relatório da Europol publicado.
Por vezes, a fraqueza das organizações terroristas, traduz-se numa maior agressividade e radicalização. São provas de vida e uma forma de inverter uma tendência de declínio.
Assim concluímos: devemos estar atentos mas não alarmados.