Há dias fui ao IKEA fazer compras e quando cheguei às caixas não havia viva alma a atender, só caixas self-service.
Os salários em Portugal são miseráveis e mesmo assim os empregadores muito ricos, não satisfeitos com a sua imensa riqueza, não descansam enquanto não forem ainda mais ricos. Enquanto nós discutimos a crescente desumanização do trabalho, estas empresas já deram um passo em frente para pior: o da exploração do cliente.
Do que conheço, é assim no IKEA, no Pingo Doce, na Decathlon e nos Bancos. Estas grandes empresas que apresentam lucros milionários estão a fazer dos seus clientes também empregados. Se eu, quando vou às compras ao Pingo Doce para pesar a fruta ou para pagar as compras, tenho de fazer o trabalho de um caixa, sou simultaneamente cliente e empregado do Pingo Doce. Quando preciso fazer uma aplicação financeira e recorro ao homebanking, estou a ser cliente e empregado do Banco. E quem me paga para isso? Ninguém.
Já foi assim com a Brisa em 2010 quando despediu, da noite para o dia, centenas de empregados, substituindo-os por máquinas semiautomáticas, em que o condutor faz o trabalho do portageiro ao ter que introduzir o ticket e o dinheiro. E, vai continuar a ser assim, sem que os preços dos produtos desçam por isso. As portagens ficaram mais baratas? Não dei por isso!
Estamos a ser explorados sem nos darmos conta. Porém, a conta virá com mais desemprego e maior assimetria entre ricos e pobres.
A obsessão por ter mais e mais, apesar de já se ter muito, tornou insensíveis os donos destas grandes empresas. Cláudia Azevedo, dona do Continente, ameaçou interpor uma ação em tribunal contra o Estado, por entender que este lhe cobrou indevidamente 1,3 milhões de impostos sobre 354 milhões de lucros excedentários. Esta “iluminada” desrespeitou os clientes do Continente, não só os que vivem do dinheiro do Estado, como os reformados, os empregados do Estado ou que recebem apoios sociais, mas também todos os que pagam impostos. E atenção, o Continente não vende artigos de luxo, mas sim bens essenciais. De facto, esta gente vive noutro planeta bem diferente do do cidadão comum que mantém em pé as suas lucrativas empresas. E caso vá a tribunal e perca, esses 1,3 milhões (0,36% desses lucros) serão recuperados ao serem repercutidos no preço dos produtos do Continente através de um subtil aumento dos preços. É assim que estes empresários fazem. E nós pagamos, nunca eles.
Eu recuso-me a ceder a esta nova forma de exploração encapotada. Recuso-me a ser roubado por quem já me rouba através da sempre impune concertação dos preços. Como é que as grandes superfícies que negoceiam a compra de toneladas do mesmo produto fazem preços iguais ou mais altos que a mercearia do meu bairro? E ainda querem que sejamos empregados deles?!
É por isso que eu não arrumo o tabuleiro na restauração dos centros comerciais, apesar dos olhares críticos do rebanho como se eu fosse um incivilizado.
É por isso que no meu Banco, a CGD, não tenho homebanking e ainda o recuso com mais vigor porque, sendo um Banco do Estado, a quem todos demos mais de 4 mil milhões para o salvar da falência, tem obrigação de prestar serviço público. E serviço público não é substituir pessoas por caixas automáticas, cobrar comissões por serviços feitos por computadores, muito menos vender homebanking a clientes analfabetos digitais que se sujeitam a ficar sem as poupanças de uma vida, porque dão as passwords a quem sabe de informática, como um vizinho, neto ou solicitador, sem ter noção que é o mesmo que dar a sua assinatura.
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É por tudo isto, que no IKEA, no Pingo Doce e na Decathlon, quando chego a estas caixas, chamo um empregado para me ensinar a trabalhar com a máquina, mas não quero aprender. Porque quando aprender, o empregado irá para o desemprego e eu serei empregado sem contrato, sem direitos e sem salário!
Sem nos apercebermos, apesar de não nos sentirmos escravos, temos um chicote apontado que nos persegue!
2 comentários
???????muita assertivo
Subscrevo e apelo a todos para que, sempre que ainda seja possível, não usem as caixas automáticas.