Saudades

Aqui e ali, ouvimos constantemente dizer, ou até cantar, que a palavra saudade é portuguesa, é nossa.

Sem querer discutir e aprofundar este assunto, direi que não concordo com este radicalismo, por diversas razões que podem assentar na forma de a mesma não ser traduzível para certos idiomas, o que não quer dizer que os sentimentos não sejam os mesmos da palavra saudade.

Aquilo que se define por saudade ou saudades, é algo que atravessa toda a humanidade e até os animais a sentem.

Podemos, podem, dar-lhe nomes diferentes mas o conceito é o mesmo. Nem outra coisa seria expectável.

Basta atravessar o rio Minho e entrar na vizinha Galiza para ver esta realidade. Eles também utilizam mais a palavra saudade, e, ás vezes, outras como estas: Desexo, Señardade, Soidade, ou Morriña. Contudo todas elas definem o mesmo sentimento: saudade.

Segundo o Dicionário Houaiss e passo a citar: a palavra saudade vem do latim solitas, ou de solus,só, solitário: sentimento mais ou menos melancólico de incompletude, ligado pela memória e situações de privação da presença de alguém ou de algo, de afastamento de um lugar ou de uma coisa, ou à ausência de certas.”

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Aqui chegados pergunto quem é que, alguma vez, não a sentiu – independente da nacionalidade- alguma dessas situações?

Atrevo-me a dizer que ninguém.

A saudade é algo difícil de explicar, porque depende de muita coisa.

Desde o século XV que, por força dos Descobrimentos que, quer descobridores, quer aqueles que os acompanhavam, pelos Oceanos, deixavam para traz a família, os amigos, e a terra, sem saber para, ou onde o mar os levava?

Para traz deixavam, mas também levaram saudades, da família, dos amigos e da terra.

Aventuravam-se, em frágeis embarcações, de livre vontade, ou recrutados à força, para realizar os sonhos dos Mestres navegadores, em busca de algo que desconheciam.

Tinham como garantida a partida, mas o regresso era misterioso e pouco provável. Essa gente anónima, e valente, não imortal, a história nada diz, mas salienta apenas o nome do grandes Navegadores.

Com eles levavam e deixavam muitas saudades e uma enorme tristeza que ecoaram nos porões dessas embarcações.

A história diz que, o nortenho, Fernão de Magalhães perdeu a vida num combate uma ilha que pertence à Indonésia, ou de Diogo Cão, algures na Namíbia. Porém sobre a soldadesca a história nada nos diz.

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Foram carne para canhão, ou para flechas envenenadas.

Porém, os portugueses, sempre quiseram aventurar-se por terras desconhecidas em busca de fortuna. E foram, para o Norte de África, para a Índia, Brasil, e todos os territórios ultramarinos.

Há quem diga que a ignorância é atrevida. Concordo, e em parte, explica muito deste fenómeno.

Estima-se que quase 40% da população de então, em dado período se mudou, despovoando Portugal Continental, a tal ponto que os reis tiveram que começar a proibir, ou a criar outras medidas como o uso de passaportes para irem para terras que eram nossas.

Ou seja: a Demografia sempre foi, e é, um enorme problema, para Portugal.

Ora, se entre os anos de 1500 e 1530 a população se situava entre 1,2 a 1,4 milhões de habitantes. Com a expulsão dos Judeus e Mouros por édito do Rei D. Manuel I, no ano de 1496, perdemos 600 mil pessoas, de certa forma mitigados pelos 150 mil escravos trazidos de África.

Mais uma vez, uns levaram saudades e trouxeram saudades e sofrimento.

Uns tiveram sorte e fizeram fortuna, outros morreram na miséria e com saudades da pátria.

Passados todos estes séculos, nesse aspecto, nada mudou. Brilha e fica para a história o nome dos  vencedores, preterindo aqueles que tornaram possível essa realização.

Porque ninguém vence sozinho, mas pode morrer sozinho e corroído de saudades.

 

(José Venade não segue o actual acordo ortográfico em vigor).

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