Sonetos escolhidos pelo autor.
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Desamor
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Mulher que me rendeste aos teus caprichos
Preso nas malhas de um amor insano
Funéreo dia em que esse amor profano
Me deixou subjugado aos teus enguiços.
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Das cinzas desse amor o céu me prive
Que o meu peito renega essa pendência
E a razão mais me avisa ser demência
Insistir na desordem que em mim vive.
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Pugno pela vontade que me falta
Para expulsar, quem dera, o teu feitiço
Mas neste palco ainda és a ribalta.
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E assim, é nesse fogo em que me atiço
– Ardendo em chama cada vez mais alta –
Que me consumo, sempre mais comisso.
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Mea culpa
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Ah, se esta contrição tornasse leve
As culpas de te haver ignorado
Mas sabes tu, mulher, é este o fado
De quem despreza o bem, e a quem o deve.
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Chamas-te tola porque idealizaste
O que se pode querer de quem se ama;
O fulgor do desejo, aquela chama
Que, como é justo, tu sempre sonhaste.
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Mas nada foi secreto e eu senti
Que perdera – imbecil – todos os créditos
Ao ler no teu olhar tudo o que li.
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E se hoje já não ouves os meus éditos
Não posso censurar-te, pois eu vi
A desistência, nos teus ombros trépidos.
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Livrai-nos deles, Senhor
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Oh Deus do mundo, Senhor do universo
Desce os Teus olhos aos míseros terrenos
Mostra de Ti o sacrossanto anverso
Às ímpias almas que em Ti crêem menos;
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Aqueles pra quem só conta o que é perecível
Os que condenam débeis e indefesos
Ao despotismo vil, à fúria incrível
Que lhes servem interesses sempre acesos.
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Piores pecados que a Teus olhem fulgem
Sem expiação possível, sem perdão,
Nem o indulto pio da própria Virgem.
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Molda essas almas, Deus, e só então
Merecerão retornar à sua origem
Mas deste mundo não tenham fruição.
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Alma imortal
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Quando esburgada desta pele que a cobre
A minha alma ao etéreo se elevar
Nas cerúleas alturas alguém há de mandar
Que outra vida eu cumpra, vil ou nobre
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E este mundo de novo me terá
De bom ou mau vestido, a acobertar
Uma alma dormente que a penar
Outro provável corpo buscará
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Ninguém voltou do Além memorizado
Daquilo que o Pai nos tem já reservado
Que pudesse contar seguramente
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Mas manda o nosso cerne acreditar
Que nesta terra há muito a caminhar
E que esta chama viverá pra sempre
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Amar é tudo
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Não há sentir maior que nos preencha
Nem há na vida nada que se iguale
A esta sensação de bem querença
De só de amor viver logo se instale
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E se sabemos que ao contentamento
Corresponde outro tanto em desencanto
Cremos também ser do amor sustento
Depois de um beijo ver brotar um pranto
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É pois feito de grandes controvérsias
Este amar tão declarado humano
Vencedor de procelas e inércias
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E se este sentimento for de engano
E transformar em mágoa o que era festa
Nunca é irreparável esse dano
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As dobras do tempo
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Verga-se-nos a vontade, a energia
A alguns momentos que o tempo suspende
O amor e a morte exercem tal magia
Que o tempo pára, e a eles se rende.
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Somos obra de Deus e a Ele se deve
– Como o exemplo que nos deu Jesus –
Que o nosso tempo seja intenso e breve
Feliz às vezes, outras uma cruz.
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É o destino que todos carregamos
Neste deambular por que passamos
Qual asserção a que há que aquiescer;
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Experimentando venturas, se amamos
Ou sofrendo atrozmente, se matamos
As mil razões que temos pra viver.