Sonetos Escolhidos – 5

Sonetos escolhidos.

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A NAU QUE NAVEGUEI

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Da minha nau restam quilhas na lama

E uns quantos madeiros arqueados

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Das côncavas cavernas dos costados

Nada que lembre o que lhe deu a fama.

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Com ela naveguei tendo a bombordo

Toda a costa africana ocidental

Depois de haver deixado Portugal

Meu adorável reino, que recordo.

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Fui penejando versos na amurada

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No coração; a saudade da amada

No horizonte; o olhar deslumbrado.

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Todas as tardes, no castelo da popa

Sempre pousava uma branca gaivota

Na espera de escutar de novo um fado.

 

 DE FÉ PERDIDA

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Cheiros de ti ficaram na almofada

Que junto à minha, alva, permanece

E enquanto me tarda a alvorada

No frio da noite só ela me aquece

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As saudades são tantas e a dor

Da tua ausência nos nossos lençóis

Trazem memórias vivas do amor

que tal como a minh’alma tu destróis

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Surgem alvores do dia e dou comigo

Remoendo as razões deste abandono

Mas mais do que abismar-me não consigo

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Porque te dei de mim todo o meu sono

Se o que investi em ti estava perdido

Até a fé, que agora não tem dono!

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EU TE NOMEIO, MÁGOA

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Eu te nomeio mágoa, que não sabes

ver neste porto o cais de uma saída

quisera dar-te a ordem de partida

pois tu recusas ver que aqui não cabes

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Nesta tristonha nau da minha vida

que tenta enfunar velas e lograr

Ganhar destreza e fazer-se ao mar

Encontrar noutras águas melhor lida

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Sigo a ternura nova de uma esperança

que me traga venturas e bonança

Eu te renego mágoa, vai-te embora!

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Que os ventos estão hoje de feição

Eu te maldigo mágoa, vai-te agora!

Já se enche de maresia o coração

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FADO MILITAR

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É lá, nesse recanto da saudade

Que mora o fado antigo, marinheiro

Aquele fado de sempre, sem idade

Que numa voz maruja foi primeiro

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Do Gama as caravelas foram palco

Dessa canção tristonha, perturbada

Que brota das gargantas em socalco

Com em soluços d’alma esfarrapada

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Falo de Portugal, emocionado

De lá trouxe o meu fado, alegremente

Numa esperança de vida, engalanado

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E inda o escuto ao longe, sobre o mar

Como se os ecos seus fossem presentes

No luso coração nele a vibrar

 

EVOCO ESPARTA

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Por ver tanta ganância neste mundo

Eu evoco de Esparta os sóbrios usos

Leônidas relembro, rei facundo

Que só esbanjou coragem c’os intrusos.

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Conjuro a educação n’essa urbe antiga

Onde o respeito aos velhos era lei

E quem malbaratasse era banido

Como gente mal querida pela grei.

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Aos jovens competia a contenção

Como princípio mor a respeitar

E a conduzir na vida a sua acção,

E cedo o seu dever era zelar

Plo sossego das gentes e do chão

D’amada pátria, o seu cimeiro altar.

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