Editorial

Um luto peculiar

Durante séculos, a família natural foi o pilar central da sociedade. Não apenas por razões biológicas e económicas, mas porque ela representa a unidade fundamental de força emocional, cultural e moral. Permita-me reformular: a família natural é o pilar central de qualquer sociedade que pretenda perdurar e evoluir.

Para meu assombro, nas últimas décadas, temos assistido a um ataque sistemático a essa estrutura, bem como a defesas caricaturais da mesma. Ao mesmo tempo em que o matrimónio é banalizado e desvalorizado por uns, é dogmatizado por outros; ao mesmo tempo em que a paternidade é enfraquecida por aqueles, ela é deformada por estes; ao mesmo tempo em que o conceito de família é subvertido como algo “opressor” pelos primeiros, é quase elevado a obrigação pelos segundos. Não está fácil ficar no meio.

A queda da natalidade e o aumento das famílias monoparentais prediz uma vitória das ideologias anti-família-natural. Estes factos não são meras estatísticas; são sintomas de uma transformação social profunda. Em Portugal, como em muitos outros países ocidentais, os divórcios superam os casamentos em várias regiões. Casar e ter filhos tornou-se uma opção secundária, e muitas vezes vista como um fardo, um atraso de vida, e até, em algumas religiões seculares como o Feminismo, como um masoquismo levado ao extremo e uma traição de classe.

A cultura presente enaltece a ideia de que a realização pessoal está acima de qualquer compromisso com o outro. É a moral revolucionária aplicada ao individualismo. Segundo Lenin (sim, esse da União Soviética), a moral revolucionária julga-se pelo que faz bem ou mal à Revolução; do mesmo modo, a moral desta cultura julga-se pelo grau de prazer, satisfação e alívio que cada um consegue produzir para si. Eis o consumidor ideal: aquele que tem o próprio consumo como sentido e propósito de vida.

Há décadas, ideologias de base marxista promovem a ideia de que a família é um instrumento de opressão. O Feminismo, por exemplo, pinta a maternidade como uma prisão, transformando o lar numa caricatura de exploração patriarcal. O resultado: mulheres incentivadas a priorizar o mercado de trabalho em detrimento da construção de um lar estável. Parece que, segundo esta ideologia, é melhor para a mulher servir a uma empresa do que à própria família. Simultaneamente, movimentos progressistas promovem a desconstrução dos papéis sexuais naturais, diluindo a ideia de que um pai e uma mãe desempenham funções complementares na criação dos filhos. Hoje, qualquer modelo é válido – exceto aquele que existiu e funcionou durante milénios.

Este enfraquecimento da família não aconteceu ao acaso. Governos e elites ideológicas desempenharam um papel crucial ao minar a autoridade parental e ao tornar o Estado um substituto da família. Por meio de políticas sociais que desincentivam o matrimónio e favorecem a dependência do Estado, criou-se uma geração de indivíduos que não precisa da família para sobreviver, mas sim de subsídios e programas assistencialistas. O pai ausente é substituído pelo cheque do governo; os avós são descartados para lares; e os filhos, em vez de serem educados pelos pais, são moldados pela escola estatal e pela cultura mediática. Tivemos, há bem pouco tempo, um ex-secretário de estado, que, sem surpresa alguma, é socialista, dizendo no telejornal que os filhos não pertencem aos pais.

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O objetivo, então, é claro: destruir a família natural como estrutura primária para que o Estado e a cultura popular – que, sem ilusões, é moldada por quem tem o poder – ocupem esse espaço. Uma sociedade sem famílias fortes é mais fácil de manipular. Mas não são apenas ideólogos e políticos que lucram com o colapso da família. As grandes corporações também beneficiam diretamente, e não é por acaso que a esquerda ideológica tem sido amplamente financiada por meta-capitalistas. Quando as famílias se desintegram, os indivíduos tornam-se consumidores perfeitos: mais solitários, mais ansiosos e mais suscetíveis à cultura do imediatismo e do descarte. A economia da solidão floresce porque um indivíduo desconectado procura suprir essa lacuna no consumo. E quanto mais desamparado ele se sente, mais gasta para tentar preencher o vazio. Isto explica o aumento da depressão e da ansiedade, bem como o crescimento da delinquência juvenil. Indivíduos sem raízes familiares são mais susceptíveis a esses efeitos, bem como a narrativas ideológicas e à dependência do Estado.

A aparente morte da família natural não é um acidente, mas o resultado de um projecto que beneficia políticos, corporações e ideólogos, à custa do bem-estar das pessoas comuns. Quem ganha com isso? O Estado, que controla mais. As empresas, que vendem mais. Os grupos de pressão e ONGs, que obtêm financiamento dos meta-capitalistas. E os engenheiros sociais, que reconfiguram a sociedade conforme as suas ideologias. Mas quem perde? Todos nós, comuns mortais.

Perdoe-me o leitor se este texto está a escurecer-lhe a paisagem, mas ele é um elogio à família natural que hoje está moribunda. Eu, um pouco triste, um pouco desgostosa, mas firme, sento-me do lado do seu leito na esperança de encontrar o remédio que a cure e a restabeleça no seu esplendor.

 

2 comentários

  1. Muitos parabéns, estou totalmente de acordo. Apenas um ponto: quando prediz uma vitória das ideologias anti-família-natural eu acrescentaria o aumento rápido de muçulmanos, cuja natalidade é 4 vezes maior…

  2. Adorei este texto! Real e oportuno. Portugal, actualmente vive doente no que respeita à saúde das Famílias. Só quando o BARCO bater no fundo, só quando o sangue da ANARQUIA espirrar na cara dos indiferentes, é que poderemos voltar a ser as FAMILIAS PORTUGUESAS. Mas até lá, acredito que haverá muito sofrimento e desespero de muitos.
    Mas tenhamos esperança; cada um que lute à sua maneira e confiemos em Deus. (Artur Soares)

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