Editorial

UMA GRANDE MENTIRA
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Ronald Silley

 

A intervenção do Sr. Ministro Matos Fernandes na AR (08.07.2020) sobre o Prédio Coutinho em Viana do Castelo foi absolutamente esclarecedora quanto a um ponto: A razão para a expropriação do prédio nada teve a ver com a necessidade daquela parcela para um mercado municipal, como alega a Declaração de Utilidade Pública (DUP) para a sua expropriação, e tudo teve a ver com a sua volumetria, por o prédio ser grande de mais e alto de mais.

 

A verdade seja dita, exceptuando a DUP para a sua expropriacão (fundamentada numa falsidade), o Governo (VianaPolis) nunca escondeu a verdadeira razão para a expropriação do prédio.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

 

“Em 1 de Junho de 2000 o ministro do Ambiente, José Sócrates, e o presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, Defensor Moura, apresentaram o Programa Polis de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental de Viana do Castelo que previa a demolição do edifício, invocando razões estéticas.” (Jornal de Notícias de 29.02.2020)

 

Numa visita a Viana do Castelo, o Sr. Eng. José Sócrates disse o seguinte: “O Prédio Coutinho é um erro urbanístico claro !” (RTP programa Sexta às 9 de 19.07.2019)

 

Recentemente, o Sr. Ministro Matos Fernandes disse o seguinte: “Os moradores estão a lesar o interesse público ao manterem em pé um abcesso urbano como é o Prédio Coutinho.” (Público de 29.02.2020)

 

Compreende-se o empenho do Sr. Ministro em demolir o Prédio Coutinho. “O Sr. Ministro Matos Fernandes foi administrador (1999 a 2005) da Quaternaire, empresa que fez para a VianaPolis vários estudos, planos e projectos no valor de mais de 500.000 euros” (RTP programa Sexta à 9 de 19.07.2019). Nesses estudos, planos e projectos figura o do PPCHVC, onde está contemplada a demolição do Prédio Coutinho. É natural que o Sr. Ministro defenda a sua dama.

 

O que é menos natural é termos um Ministro numa posição e com poderes para avaliar, ajuizar e decidir sobre planos, estudos e projectos feitos por uma empresa da qual ele foi administrador, precisamente quando esses estudos, planos e projectos foram feitos.

  

Em 2002 é aprovado o Plano de Pormenor do Centro Histórico de Viana do Castelo (PPCHVC) que se propõe (Art. 1): “Eliminar as intrusões visuais e as discrepâncias volumétricas de modo a repor, na sua heterogeneidade, o equilíbrio morfológico do centro histórico em ordem à criação de condições para a sua classificação como património mundial.”

 

O enunciado propósito do centro histórico vir a ser Património Mundial não tinha qualquer fundamento. Foi uma falsidade perpetrada pelo Governo (VianaPolis) que na altura serviu para silenciar muitas vozes que se opunham à demolição do prédio e que, muito provavelmente, foi determinante para o sentido da votação que aprovou o PPCHVC (47 votos a favor, 27 contra e 1 abstenção).

 

Outra falsidade na altura propalada, que certamente também influiu no sentido daquela votação, foi a de que o custo com a expropriação do prédio, a sua demolição e a construção do novo mercado  seria suportado por fundos comunitários, o que na altura não se cansou de enfatizar o Sr. Presidente da Câmara.

 

Os membros da Assembleia Municipal votaram no pressuposto de que a demolição do prédio era condição necessária para o centro histórico vir a ser classificado como Património Mundial e de que o custo com a expropriação/demolição do prédio e a construção do novo mercado estava assegurado por fundos comunitários. Teria o sentido da votação sido o mesmo se na altura soubessem que o centro histórico não seria Património Mundial mesmo que o prédio fosse demolido e que o custo com a expropriação/demolição do prédio e a construção do novo mercado teria de ser suportado pelos contribuintes portugueses? 

 

Em 2005 é publicada a DUP para a expropriação do Prédio Coutinho, na qual se invoca a necessidade daquela parcela para um mercado municipal.

 

Como pode em boa fé o Governo (VianaPolis) invocar a necessidade da parcela do Prédio Coutinho para um mercado municipal, quando foi o próprio Governo (VianaPolis) quem, no âmbito do PPCHVC, acabou com o bonito mercado municipal (Arq. João Andresen) que havia e que funcionava lindamente a menos de 100 metros do Prédio Coutinho, tendo-o demolido em 2003 ?

Ao demolir o mercado municipal existente, o Governo (VianaPolis) criou deliberadamente a necessidade dum mercado municipal.

 

Para mais, a cidade dispunha de outros locais muito mais apropriados para receber um mercado municipal, como por exemplo:

1) O do actual mercado em funcionamento, o que aliás a Câmara Municipal reconhece num vídeo promocional colocado no site da autarquia e no Youtube.

2) O da antiga Praça de Touros. Um local desafogado dispondo de amplo estacionamento à superfície.

3) O do Centro Comercial 1 de Maio. Com uma localização muito central e outrora cheio de actividade, ele é hoje um espaço quase desértico.

4) O do denominado Edifício da Marina. Situado em frente do Prédio Coutinho, à beira do rio e ao lado da marina, é um local com belos espaços envolventes e dispõe de amplo estacionamento à  superfície.

 

É óbvio que a parcela do Prédio Coutinho não era de todo necessária para um mercado municipal. A única razão porque aquela parcela foi escolhida para um mercado municipal foi para justificação da DUP para a expropriação do prédio. Foi um pretexto, uma artimanha do Governo (VianaPolis) para conseguir a expropriação do prédio e a sua subsequente demolição.

 

Existem princípios de convivência civil, infelizmente ignorados por alguns dos nossos políticos, pelos quais vale a pena lutar.

 

A estética jamais poderá ser colocada antes e acima das pessoas.

 

“A Pessoa Humana está antes e acima de tudo, inclusive da Economia, do Mercado.” (Fausto de Quadros in “Direito da União Europeia”)

 

Que diriam os nossos tribunais se confrontados com uma DUP fundamentada na estética do prédio? Quero crer que dificilmente sancionariam tal DUP. Em nenhum país decente se expropriam pessoas por causa da estética das suas casas.

 

No entanto, foi precisamente isso o que aqui aconteceu. O Prédio Coutinho foi expropriado por causa da sua estética. Em resumo e na definição do PPCHVC, por constituir “intrusão visual e discrepância volumétrica”.

 

O Governo (VianaPolis) sabia das dificuldades que teria em expropriar o prédio com uma DUP fundamentada na sua estética. Por isso engendrou a espúria razão da necessidade daquela parcela para lá fazer um mercado municipal.

 

Pode dizer-se o que se quiser sobre o Prédio Coutinho. Que está ali a mais, que é um erro urbanístico, que é um abcesso urbano, que nunca devia ter sido licenciado, que é horroroso, que é um monstro, que é um cancro que tem de ser extirpado, enfim, pode dizer-se tudo e mais alguma coisa. Mas há uma coisa que em boa fé não se pode dizer: que aquela parcela era necessária para lá se fazer um mercado, como diz a DUP para a sua expropriação.  

 

A DUP para a expropriação do Prédio Coutinho está fundamentada numa falsidade. A DUP para a expropriação do Prédio Coutinho é uma grande mentira. 

 

Na sua intervenção, o Sr. Ministro Matos Fernandes, sem qualquer contraditório, deu a entender que tudo estava bem com as contas da VianaPolis. Infelizmente, isso não é verdade.

“Desde 2007 que a VianaPolis apresenta todos os anos resultados líquidos nulos.” (RTP programa Sexta às 9 de 19.07.2019) https://www.rtp.pt/play/p5338/e419480/sexta-as-9

Isso só foi possível porque a VianaPolis ocultou, ano após ano, a verdade substancial e material da situação económica e financeira da empresa, apresentando nas suas contas trabalhos da empresa para a própria empresa como se de um investimento se tratasse, com um valor feito à medida dos seus gastos de exploração e desta forma apresentar resultados líquidos nulos, quando na realidade, uma vez expurgado o valor ficcionado dos proveitos de exploração, os resultados líquidos apresentariam sempre um prejuízo avultado. 

  

“A VianaPolis já gastou mais de 34 milhões de euros para demolir o Prédio Coutinho” (RTP programa Sexta às 9 de 19.07.2019).

O país não está em condições de se permitir desvarios financeiros desta ordem.

 

O Governo (VianaPolis) pode recuperar essa verba se desistir da demolição do prédio e vender as fracções que detém, uma vez que muitos dos proprietários que acordaram vender as suas fracções à VianaPolis renunciaram ao direito de reversão e essas fracções valem hoje muito mais do que aquilo pelo que foram adquiridas. Há 15 anos que a VianaPolis vem adquirindo fracções. Deste modo talvez a VianaPolis acabe por apresentar algum lucro. Se o prédio for demolido, o valor das 105 fracções (dinheiro do contribuinte) vai pelo cano abaixo, além da destruição dum valioso património como é o Prédio Coutinho.

 

O Sr. Ministro Matos Fernandes disse que os moradores estão a lesar o interesse público ao manterem em pé o Prédio Coutinho. Na realidade, os moradores estão a defender o interesse público ao impedirem que o Governo (VianaPolis) destrua património e erário público.

 

Num país com falta de habitação e falta de dinheiro, a destruição de património e de erário público que a demolição do prédio representa, é absolutamente inaceitável.

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