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Vazio diretivo aflige Atlético dos Arcos com pré-epoca da equipa sénior por planificar

O Atlético dos Arcos atravessa um período de grande indefinição. O anunciado abandono do presidente, José Carlos Caçador Marinho, abriu um vazio diretivo sem solução à vista e o clima de instabilidade é extensivo à equipa de futebol. O técnico Leandro Morais também está de saída.

“Depois de quatro anos de sucessos desportivos, assentes num projeto de rigor financeiro, aposta na formação e nos atletas de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca, o Atlético caiu num vazio diretivo”, refere o comunicado que a coletividade arcuense publicou no Facebook institucional.

“A mais do que provável e previsível saída de José Carlos Caçador e de Leandro Morais, dois dos grandes rostos do nascimento deste novo Atlético, criam um problema, que só será ultrapassado com a vontade, de sócios, adeptos e forças vivas do concelho, em manter aquele que, no momento, é o clube mais representativo do concelho”, acrescenta a nota.

A crise adensou-se no seguimento da infrutífera Assembleia Geral realizada no passado dia 17 de julho, em que nenhuma lista concorreu aos órgãos sociais. E da reunião havida no dia 22 de julho também não saiu “fumo branco”.

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“O passo seguinte será [promover] uma reunião com a autarquia, com a finalidade de apresentar a situação ao senhor presidente da Câmara e respetiva vereação do pelouro do Desporto”, lê-se no comunicado, que apela à participação dos sócios para “ultrapassar o impasse”.

Entretanto, Leandro Morais, o (ainda) treinador e um dos principais impulsionadores para a fundação do clube há quatro anos, acredita no “juntar de vontades” para ultrapassar a atual crise e dá a “receita” para prosseguir o trilho do sucesso.

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“Quem vier tem de estar rodeado de pessoas capazes e estar preparado para ouvir críticas, que existirão sempre, mantendo a atual filosofia do clube de ligação à Terra”.

“Porque o mais difícil está feito – “conseguimos construir o edifício” –, haja, agora, alguém com “coragem para assumir as rédeas do clube”, exorta Leandro Morais, avisando que, “neste momento, o clube não tem pré-época planificada, não tem jogadores contratados e está sem direção.”

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Com realismo e crença à mistura, diz que o Atlético “vai arranjar, no entanto, uma solução diretiva”, embora haja o receio de ver a equipa de futebol “perder identidade”, que foi alicerçada por “gente dos Arcos” durante quatro anos.

Nesta entrevista, Leandro Morais lança um “grito de alerta” e faz a apologia da “união” para que o Atlético dos Arcos inicie, com outras pessoas, um novo ciclo. Sem ele e sem José Carlos Caçador. A palavra está do lado dos sócios…

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Minho Digital (MD) – Após quatro épocas de grande protagonismo desportivo, com o Leandro Morais à frente da equipa técnica, o Atlético dos Arcos caiu num vazio diretivo. Como é que explica este paradoxo?

Leandro Morais (LM) – Há vários fatores que levaram a isso. A primeira razão para o atual impasse resulta da saída do presidente [José Carlos Caçador Marinho], que tem feito um trabalho notável, mas muito desgastante e difícil, pelo que, acredito, tem vontade de parar um pouco para descansar.

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Depois, o clube, com apenas quatro anos de existência, tem, ainda, um défice de sócios, algo que não ajuda a superar esta situação.

Outro fator primordial é uma certa cultura instalada, de criticar por criticar, que é tipicamente portuguesa. Todos sabemos que é mais fácil destruir e estar do lado de fora…

MD – Há muitos detratores do clube na praça pública?

LM – É geral, isso tem que ver com uma forma de ser dos portugueses… São poucas as pessoas que, estando do lado de fora, reconhecem o trabalho de terceiros. Mas, também, há quem esteja do lado do Atlético e isso foi demonstrado durante estas quatro épocas, em que houve sempre muita gente no estádio a apoiar a equipa. Mas uma coisa é apoiar o clube, outra é trabalhar e estar preparado para se sacrificar 24 horas por dia, de forma graciosa ou a receber o mínimo.

Devo dizer que houve pessoas que, na fase inicial, mostraram alguma disponibilidade, mas falta alguém que assuma o papel principal. Mas acho que é possível arranjar uma solução. É preciso que as pessoas se juntem e se unam em prol do clube. Não podemos ter medo de falhar nem das críticas, que são sempre muitas. Há gente com capacidade nos Arcos, mas tem faltado coragem…

MD – Mas como é que explica aos sócios a anunciada saída do presidente e o seu próprio adeus?

LM – É importante, nesta fase, o Atlético mudar e iniciar outro ciclo. Apesar de haver bastante gente a colaborar, a verdade é que o Atlético não pode continuar refém de duas pessoas, que, no caso, são o presidente, José Carlos Caçador, e eu.

MD – A mudança tem mesmo de passar pela saída dos dois? E se houver uma “vaga de fundo” acredita que a situação se possa reverter no caso do presidente?

LM – Em primeiro lugar, não há pessoas insubstituíveis no desporto. Haverá, com certeza, outras pessoas qualificadas para fazer um trabalho igual ou melhor do que nós fizemos, desde que haja coragem de assumir o desafio e de arriscar o insucesso.

Se é possível o Caçador reconsiderar? Era importante, na minha opinião, haver uma solução nova, mas compreendo que não seja fácil arranjar uma pessoa com as características dele para o cargo. Defendo uma solução nova, visto o cansaço que sinto nele, e porque o clube, também, precisa de se abrir e era importante que as pessoas mostrassem que querem um Atlético vivo. O clube não é de ninguém, não é do Caçador, do Leandro ou dos diretores… É de todos os arcuenses.

Ou seja, para o Atlético, que representa a vila e o concelho, não é muito saudável que sejam sempre as mesmas pessoas a dar a cara. É importante que venham outras pessoas mostrar trabalho na área do treino e da direção.

MD – Qual o prazo-limite para um “virar de página”?

LM – Acredito que o deadline ainda não chegou, mas aproxima-se muito rapidamente. Era importante que alguém tomasse as rédeas da situação e que demonstrasse coragem para levar o projeto em diante. A pior coisa que podia acontecer é o projeto não ter continuidade. Não faz sentido nenhum, porque não existem dívidas e, em termos de projeção, o clube está muito bem.

MD – A anunciada reunião com o Município pode dar um “empurrão” definitivo para uma solução a contento de todos?

LM – Acredito que a autarquia, nestas situações, pode ter um papel muito importante, pela influência que exerce. Sinto que a Câmara está do lado do Atlético. É importante que, com as atuais infraestruturas, o clube continue, de forma estável. A palavra deles é importante nos momentos difíceis. São pessoas sensíveis ao desporto e acredito que vão fazer um esforço grande para arranjar uma solução que traga uma nova era e novas pessoas para o Atlético.

MD – Quando é que tomou a decisão de abandonar o comando técnico do Atlético?

LM – Tomei a decisão de sair antes de acabar o campeonato. Só ainda não a tornei pública, porque acho que não o devia fazer enquanto o clube não estivesse minimamente estável… A minha decisão, com a saída do José Carlos Caçador, é de sair também. Entendo que este ciclo terminou e é a altura de mudar a equipa técnica, já que os jogadores merecem continuar. Depois de quatro anos de luta, teria de aparecer uma situação muito específica para eu continuar. Sou muito de ideias fixas e, quando meto uma coisa na cabeça, dificilmente consigo mudar. Espero que se arranje uma solução.

MD – Em que medida está comprometida a nova época?

LM – Na minha opinião, as coisas já deviam estar orientadas, porque o Atlético tem um jogo, no dia 4 de setembro, a contar para a Taça de Portugal. Em circunstâncias normais, a equipa teria de fazer uma pré-época durante quatro semanas, ou seja, na pior das hipóteses, o plantel teria de começar os trabalhos no próximo dia 7 de agosto. Mas, neste momento, o clube não tem pré-época planificada, não tem jogadores contratados e está sem direção.

Seja como for, o mais difícil está feito: foi trazer o clube do zero e colocá-lo num bom patamar, com base num grupo de jogadores da terra, com qualidades, os quais se identificam com o clube. Lembro que os grandes prejudicados são os jogadores. Eles estão muito preocupados, sentem que deram muito ao clube, alguns deles recusaram, inclusive, convites durante e no fim de época… Foi criada uma união tão grande que os jogadores têm muita dificuldade em se despegar do clube.

MD – De que mais se orgulha no percurso de quatro anos como treinador do Atlético?

LM – A maior conquista do Atlético, mais do que os títulos alcançados, foi tornar vencedora esta equipa e criar um forte espírito de grupo, assente na amizade e na entreajuda. O meu maior receio é ver perder esta identidade, mas, quanto ao resto, acredito que o Atlético vai arranjar uma solução diretiva.

MD – O carisma do presidente e do treinador ajudaram a criar a identidade de que fala?

LM – O Caçador teve uma influência importante, porque é uma pessoa muito tranquila e soube fazer uma ótima gestão. O meu papel, acredito, também foi importante, em função do meu passado como jogador e do exemplo positivo que dei em prol do clube.

MD – Este clima de instabilidade cria insegurança nos jogadores. Não existe o risco de perder muitos jogadores?

LM – Há essa insegurança, mas tão importante quanto manter o plantel é preparar bem a pré-época, algo que foi um dos grandes trunfos em épocas findas.

MD – Qual foi o seu papel estes quatro anos fora do campo?

LM – Há pessoas que não conseguiram perceber aquilo que é o Leandro dentro e fora do campo. Foi preciso separar muito bem os interesses do clube e as amizades. Por isso, quem vier a seguir tem de seguir esta linha. Se não for o caso, o ambiente pode descambar muito facilmente.

MD – Há treinadores nos Arcos com capacidade para fazer esta gestão? Pedro Martins é o mais capaz?

LM – Sim, o Pedro é uma pessoa capaz. Mas existem pessoas como o Luís Rebelo, o David Cortez, o André Sá… E outros… Há muita gente com paixão pela terra e com capacidade de distinguir os interesses pessoais e os do clube. É uma luta dura, porque é mais difícil gerir o trabalho fora de campo.

MD – A que tipo de pressões é que esteve sujeito?

LM – Há muitas maneiras de exercer pressão. Quando há amizades de vinte anos, e porque não metes um filho a jogar, um marido ou um irmão, e as pessoas deixam de te falar na rua, estamos na presença da maior pressão que pode existir… Comigo, isto aconteceu várias vezes.

Mas as pessoas foram percebendo, com o tempo, que as coisas não funcionavam assim. Nem funcionavam ao contrário, pois nunca castiguei um jogador porque alguém deixou de falar comigo.

A qualidade do treino é que é determinante e, por vezes, temos de pensar mais à frente, para garantir o futuro do clube. Não podemos estar sempre amarrados a jogadores que, como eu, tiveram o seu tempo, mas, sem faltas de respeito, o clube tem de continuar.

Esta situação gerou, claro, algumas inimizades. E lembro, também, o boato sobre o meu ordenado, que foi uma invenção.

MD – Quais os principais momentos desportivos que viveu à frente do Atlético dos Arcos?

LM – Houve vários. Conquistámos um título (1.ª Divisão) logo no primeiro ano; não fomos campeões, na terceira época, porque não nos deixaram; fizemos uma campanha espetacular na Taça de Portugal em 2015/2016; e conseguimos, ainda na época finda, conquistar a Taça da AF Viana do Castelo. A minha ideia era, em cinco anos, conquistar um título no escalão principal pelo Atlético. Como se vê, superámos muito isso.

MD – E qual o maior amargo de boca?

LM – Em termos desportivos, foi a finalíssima da época 2014/2015, porque foi um ano de trabalho que se esfumou por causa de um lance… Mas a caminhada foi extraordinária, praticamente irrepetível. Não me deixei afetar como treinador, mas fiquei magoado como pessoa, devido a algumas atitudes. Houve pessoas que mudaram de postura por ter escolhido, ou não, um jogador, por ter levado um treinador…

MD – Quais os jogadores que evoluíram mais neste trajeto?

LM – Todos tiveram uma evolução muito grande. Temos de ter em conta que estes jogadores não estavam habituados a jogar para ganhar e a conquistar títulos. A mudança de mentalidade foi a maior conquista que tivemos. Passámos a jogar, mesmo fora, para ganhar sempre. Na época finda, eles ganharam um título e querem continuar a ganhar.

No geral, os jogadores cresceram muito, até um jogador que promovemos dos juniores, o Luís, acabou por marcar seis ou sete golos. Mas houve jogadores que evoluíram imenso. O guarda-redes, Cesteiro, fez uma época extraordinária. Já era um bom guarda-redes, mas progrediu muito. A malta de defesa esteve muito bem, o José Francisco, o Paulo Pereira, o Hélder Feijó, que, para mim, fez a melhor época dele. Também o lateral-esquerdo, Pedro Rocha, que andava no futsal, é, hoje, muito apreciado no distrito. No meio-campo, o Patrick foi extraordinário, fez mais uma grande época; o Guima, que veio do Paçô, deu um grande salto, e está preparado para outro campeonato; o Marco evoluiu muito; o Nelson Ventura; o Flavinho… Trouxemos na época anterior, dois miúdos do Paçô, o Bonera e o Filipe, que tiveram alguma dificuldade no início, mas estão, atualmente, muito mais preparados para serem jogadores importantes para o clube.

Destaco, também, o Licas, que veio há dois anos do Paçô, estava a fazer uma época muito boa, teve a infelicidade de se lesionar, quando era o segundo melhor marcador da época.

MD – Acredita que há outro “Pedro Tiba” por descobrir?

LM – Acredito que sim. São precisas oportunidades, porque um jogador com muita qualidade tem dificuldade em sobressair num campeonato mais fraco. Os bons jogadores revelam-se a jogar com os melhores. Temos jogadores que precisam de uma oportunidade. Se eu tiver a oportunidade de treinar noutro campeonato, irei, com certeza, levar alguns comigo. Não tenho problema nenhum em dizer que o Marco, o Hélder Feijó, o Serginho, o Licas, o Campos, o Ventura, o Patrick, o Guima, e outros, são jogadores que podem jogar em patamares superiores.

MD – Em que medida é que este impasse pode vir a dificultar o recrutamento de jogadores?

LM – Pode… O Atlético tem duas lacunas – nas posições de guarda-redes [Cesteiro está de saída] e avançado, devido à lesão do Licas e porque o Campos se lesionou ontem [26 de julho], com gravidade, numa brincadeira, indo ser operado à clavícula – e os jogadores substitutos estão identificados, mas os dias vão passando. Em circunstâncias normais, dentro das possibilidades do clube e com o rigor do costume, ter-se-ia já agido…

MD – O Cesteiro é uma baixa de peso. Como é que o Atlético vai encontrar uma solução à altura?

LM – Esse é um problema que o Atlético vai ter de resolver, apesar de haver guarda-redes no concelho com qualidade, mas sem a experiência do Cesteiro, que valeu pontos e um título. Não foi só ele, mas ajudou muito. Tem capacidade, mais do que suficiente, para jogar num escalão superior.

MD – E qual é a sua ambição como treinador?

LM – Como jogador, passei por vários clubes de Viana. E tenho a ambição de um dia poder treinar noutras divisões até para perceber aonde vai a minha capacidade. Quero evoluir na carreira, mas é a situação do Atlético que me preocupa nesta altura, principalmente pelos jogadores que não merecem estar a passar por esta situação.

De resto, tenho, também, a vontade de trabalhar noutras áreas, nomeadamente nas de scouting e de observação. Estou aberto a todas as possibilidades, que têm aparecido. Mas, fruto do impasse que atravessa o Atlético dos Arcos, recusei, em concreto, um convite porque tinha de deixar o trabalho e, neste momento, não estou interessado nisso. Ainda tenho uma ou outra situação pendente, fora do distrito de Viana, nomeadamente a possibilidade de treinar uma equipa e de me dedicar à observação e scouting, nos campeonatos profissionais. Há dois convites em aberto, que se podem concretizar.

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