Xeque

Num tabuleiro quadrado, dividido num padrão de quadrados brancos e castanhos, dois pares de mãos moviam peças brancas e castanhas.

Quando elas pararam, dois lados do tabuleiro eram ocupados por essas peças, umas brancas e outras castanhas, distribuídas da mesma forma.

E, lentamente, as mãos foram movendo as peças. Cada uma tinha um objetivo, um final diferente. Umas eram removidas do tabuleiro, outras removiam peças da cor contrária. E tudo isto era controlado por essas mãos humanas.

Afirmo com quase certeza que cada peça acredita que tem consciência própria. O propósito delas é ganhar às peças da cor contrária, e fazem tudo o que fazem por vontade delas mesmas.

Infelizmente, não têm noção das mãos que pegam nelas. Não conseguem entender a agressividade ou a levidade com que se mexem para ocuparem um novo quadrado, nem o facto de estarem a inutilizar outras peças ou a serem, mesmo, sacrificadas.

E nós, que temos mãos, também podemos ser assim. Vivemos num tabuleiro repleto de quadrados e quadrados de cores diferentes. Se somos divididos em duas cores, penso que não, mas parece que podemos andar muito perto dessa solidão. Pois, há quem ache que é necessário controlar peças neste mundo, fazê-las perecer algo mais do que são e fazê-las aniquilar para se alcançar um qualquer objetivo que parece nunca absorver a humildade e somente pensa na glória.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Mas será mesmo uma vitória? Ou será só mais um passo para a loucura? As guerras ganham forma real e os seus xeques-mates ainda não estão perto de serem alcançados. Com o avançar do tic tic dos relógios, os tabuleiros vão ficando mais vazios, mais uniformes. Mas não é essa uniformidade de raça, de religião, de nação, de cultura que torna um tabuleiro mais livre.

Celebramos a nossa liberdade e sinto que todos somos livres, todos temos o direito de o sermos, e é importante que não mais tabuleiros fiquem vazios, tristes, devastados na contínua loucura dos longos anos da história humana, mas tão ínfima na vida do Universo.

Durante este tempo, as mãos continuaram a jogar o seu jogo de xadrez no tabuleiro inicial. Um dos pares fez o suficiente para chegar a um xeque-mate. Quase todas as peças que estavam no início desapareceram. Mas uma coisa é certa: os reis ficaram, sós, vazios, perdidos.

Mas… sei que as peças em redor do tabuleiro já dão passos nos mesmos sonhos de liberdade, com o odor de tantas flores de primavera… e que a mim me fazem espirrar!

 

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1 comentário

  1. Sem dúvida! Neste reino sem reis ou de fracos reis, cada vez mais o povo segue para o açougue da vida. Parabéns pelo tema. Soares da Siva

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