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O Lugar das casas de persianas fechadas em Melgaço

Vista da aldeia

Amial ficou sem residentes desde o final de 2015

O Lugar de Amial, da Freguesia de São Paio, Melgaço, é o exemplo mais recente de um interior que se vai esvaziando sem se compadecer com a paisagem ou com a viabilidade agrícola do parcelário outrora fonte de rendimento.
A pouco mais de quatro quilómetros do centro de Melgaço – e de onde se tem uma interessante vista panorâmica sobre o concelho e o território galego – o Amial hoje pouco mais é do que um depósito de memórias de quem ali cresceu.
A passagem frequente de tractores e até do ‘guardião’ do lugar, que todos os dias vai cuidar do gado e das casas que ali permanecem, é o movimento possível depis de ter perdido, em finais de 2015, a sua última residente frequente.

Aquando da nossa visita ao Lugar, até onde as indicações foram claras e as condiçoes rodoviárias impunham o limite, foi António Esteves, o mais recente morador da localidade, que nos traçou o melhor e o pior cenário daquele aglomerado de casas. Com a paisagem urbana e rural de Melgaço em fundo, o morador lamentava a perda progressiva do parcelário agrícola, hoje já não tão humanizado, a que nem as novas políticas (que diziam precisar tanto do sector primário) conseguiram inverter a tendência.
Com ligações familiares a este rincão, só em 2012 comprou a casa de família, depois de mais de quatro décadas em França, sua casa desde que saiu de Melgaço “com passaporte de coelho” no início da década de 70. Hoje, depois de um longo impasse familiar relacionado com partilha de bens herdados, António Esteves (re)começa a criar ligação sentimental ao concelho, de onde saiu ainda menor e do qual só conhecia bem os carreiros do contrabando. À memória ainda lhe vem o dia em que, em Lamas de Mouro, lhe apreenderam oito vacas.

Ao olhar para os socalcos com mato ou de pousio, diz não entender porque é que “a gente nova não olha para isto”, mas acredita que ainda não é o fim do ciclo para aquelas terras. As casas, algumas em ruínas e das quais apenas resistem as paredes, parte do ‘sobrado’ e as novas (em folha) placas de numeração da nova toponímia.
António indigna-se com o poder local, que diz não responder aos seus alertas quando fala de um antigo caminho que passa entre as casas na ponta daquele lugar. No fim da estrada alcatroada, o caminho prolonga-se entre o casario e dá lugar a um caminho florestal e que António diz ser um dos antigos caminhos para Santa Rita (em Roussas). No entanto, a água das chuvas que desce pela encosta está, a cada Inverno, a levar parte da terra que dá forma a esta ligação entre o fim do alcatrão e o trilho florestal.
António diz que está disposto a fazer cedências e até a mudar um espigueiro junto ao trilho para que seja construido um caminho seguro. Deixa também por esta via o recado, até porque a sua presença não é para ficar. Depois de um mês de férias para ver o andamento das obras de recuperação da casa, voltaria para França, onde tem um negócio. Definitivamente, só um Agosto festivo e solarengo voltará a trazer vida a estas casas de persianas fechadas.
A capela, de porta fechada à chave, não nos dá a certeza que divindade alberga ou se a imagem está no altar. Para o que der e vier, trancas à porta. As casas estão seguras. Por outro lado, o interior do país continua a ser espoliado e aqui, “ir para a terra” é sempre sinal de luto.

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