Bicadas do Meu Aparo: O pedreiro

 

 

 

Escritor d’ Aldeia *

 

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Conta-se que um profissional da construção civil – pedreiro – trabalhou no mesmo patrão mais de quarenta anos e, em determinado dia avisou a empresa que ia pedir a reforma.

O patrão concordou e disse ao seu colaborador: peço-lhe apenas um último favor – aguente ao serviço apenas mais seis meses, pois preciso de si para construir uma casa ali na Cerca. Pode ser? – perguntou.

O pedreiro disse que sim, sentiu-se até contente por ser uma vez prestável e iniciou a construção da casa, sabendo onde estavam os materiais a utilizar. Finalmente, o patrão disse-lhe: se fizer falta algo para a obra, que não haja no armazém, faça a lista para mandar vir, porque não quero mesmo estorvar o dia da sua merecida reforma.

Iniciada a construção da casa e gastos pouco mais de cinco meses, o pedreiro entregou as chaves da nova casa ao patrão e, que agora sim, passaria à reforma.

O empresário, seu patrão, delicado, simpático e como amigo que sempre foi do seu pedreiro, devolveu-lhe a chave da nova casa e disse-lhe: a nova casa é para si e sua família, já está registada em seu nome e é o prémio que a empresa lhe dá pelos seus quarenta anos de trabalho.

Imagina-se facilmente a alegria do pedreiro!

No entanto, o pedreiro, ao deitar-se nessa noite para dormir, não deixou de perguntar a si mesmo: porque é que não adivinhei que a casa era para mim? Se adivinhasse, utilizaria outros materiais, aplicaria mais perfeição no trabalho e não teria a pressa que tive em construí-la.

 

Como construir uma casa, a vida de cada homem também se constrói dia-a-dia. Tantas vezes somos capazes de fazer o melhor e tantas outras, capazes de fazer apenas “a minha obrigação”. Daquilo nos alegramos e disto nos acusamos outras, por termos a noção de que podíamos fazer mais e melhor.

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Uma vida vivida com dignidade não é, de todo, fácil. O homem sempre terá sido complicado, difícil a conviver com os outros e quando se buscam os lucros e os outros “que se governem, se desenrasquem”, é mau e pode ser até perigoso viver-se em tais caminhos pouco lisos.

Logo, a vida – para ser equilibrada – é um projecto que nós mesmos construímos: ou vai em linha recta, ou às curvas, aos solavancos e tantas vezes construímos vidas com lombas e valetas, ficando acantonados em qualquer lado dela.

O homem de hoje preocupa-se pouco com a responsabilidade profissional, familiar e social e até na responsabilidade política! Vejamos a política que se vive entre nós e a democracia que a sustém. Miséria total: política e democracia, caninas.

Pelo que, bem o sabemos, procuram-se facilidades. O estudante passeia os livros na mochila; o empregado comercial não sabe acolher/atender verdadeiramente o cliente que entra, e o pedreiro passa o tempo a olhar o relógio para ir embora.

Ora esta forma de viver, de projectar, de ser responsável…, pode ter muitas coisas, mas nunca pode ter ou chamar-se vida virtuosa. Sendo assim, concluímos que só há virtude na vida de cada homem, quando se faz bem, com perfeição e com paixão tudo aquilo que realizamos, que fazemos.

Também sabemos que quem trabalha simplesmente para ganhar dinheiro ou à espera que o tempo passe depressa, nunca será homem admirado, respeitado, de homem com valor. Facilmente pode ser apontado de veraneante.

É verdade que há quem trabalhe sem fazer o que mais gosta por diversos motivos sociais. Mas não podendo ser de outra forma, também sabemos que havendo dedicação, zelo e carácter, todo o trabalho faz esquecer a fadiga.

Logo, trabalhar com interesse ou alegria, não só dá satisfação por dentro, como por fora. Dessa forma, sendo assim – também se sabe – nasce a grandeza das aldeias, das cidades e das nações.

Entendo, portanto, e resumindo a casa nova do nosso pedreiro, que um dia todos colhemos apenas e só o que construímos, bem como os materiais aplicados que por nossas mãos passaram e que a cabeça projectou.

* O autor não segue o acordo ortográfico de 1990.

 

* O autor não segue o acordo ortográfico de 1990

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