Cortar a direito

Estamos a uns meses de cumprir 50 anos a viver(quase) em democracia plena.

De celebrar Abril de 1974, como até aqui. Mais do mesmo e não numa perspectiva de evolução no sentido que esta data seja inclusiva e abrangente, de todos, e não propriedade de partidos da esquerda ou extrema-esquerda, ou de militares com rabos de palha, como se tem visto.

Celebrar Abril, tem sido, apenas, para um punhado: desde os deputados da nação, ao governo e às elites municipais, de engravatados ou com fardas de gala e discursos inócuos e repetitivos e ocos de conteúdo, pelos mesmos de sempre, quando este dia devia ser aglutinador, de festa popular, extra-muros, democrática, ao alcance de todos e por todos participada.

O 25 de Abril não for feito por uma só pessoa, nem duas, nem cem, mas por milhares de homens e mulheres, que aqui e ali, deram o seu precioso contributo, pelo que é abusivo, no mínimo, alguém (?) se achar dono dessa data. Mas essa tem sido a realidade e, embora não me conforme, continuará a ser assim não sei por quanto tempo mais.

Medir a democracia, e esta data, a partir do 25 de Abril de 1974, não é inteiramente verdade. Começamos, isso sim, a ser efectivamente mais livres, após o 25 de Novembro de 1975. Podem dizer o que quiserem, de o negarem, branquearem, de o esconderem, mas eu vivi toda esta narrativa.

Negar este facto do 25 de Novembro, e não o querer celebrar é esconder algo verídico, determinante, da nossa história contemporânea e que perturba muitos, que não é nem será consensual, enquanto for sonegada e não ensinada nas escolas, sem subterfúgios, mas apenas e só com a verdade dos factos documentados.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Nem o 25 de Abril é uma data consensual, nem nenhuma o é. O que não me parece bem, é o esquecimento sistemático deste facto histórico, determinante, para que agora, estejamos aqui (embora já muito condicionados, é certo) a usufruir daquilo que resultou da derrota do 25 de Novembro. Acredito que, um dia, será efectivamente tido em conta, sem revanchismos ou donos, para que seja uma data de reflexão e que aglutine e conte a verdade.

Sem a derrota do 25 de Novembro, provavelmente, nada teríamos, em 2024, para celebrar, ou quiçá celebraríamos a mesma, mas em ditadura.

Rasgar com esta casmurrice sectária, e mentirosa, não será fácil porque, para muitos ditadores travestidos de democratas de última hora, é algo incómodo, mas esta data tem o mesmo valor, ou mais que a primeira. Acredito que, o poder mais democrático que temos há 47 anos: as Juntas de Freguesia e as Câmaras Municipais, já com outras mentalidades, comecem a celebrar o 25 de Abril e o 25 de Novembro, sem complexos e de forma pedagógica e inclusiva, popular e sem donos ou discursos bolorentos. Que seja, apenas, uma festa de todos e para todos, que comecem a cortar a direito.

Ah, ainda falta celebrar o nascimento de Portugal como Nação:  o 5 de Outubro de 1143!

 

* O autor não segue o acordo ortográfico de 1990

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