Solidão e depressão, um binómio perigoso

«O segredo de uma velhice agradável consiste apenas na assinatura de um honroso pacto com a solidão»

Gabriel García Márquez, em ‘Cem Anos de Solidão’

Boa noite solidão
Chegas um pouco atrasada
Mas não faltas, minha amiga
Ao convívio que te aguarda
Neste pobre coração
De uma tristeza exaurida.

Eugénio de Sá

 

Segundo o poeta John Donne; “nenhum homem é uma ilha que se completa em si próprio”.

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Esta expressão reflecte que somos seres concebidos para viver em sociedade, embora haja quem prefira furtar-se ao convívio social e isolar-se, cultuando a sua própria solidão. Não obstante, a longo prazo os efeitos da solidão podem, também neles, tornar-se a causa de perigosos distúrbios da personalidade.

Tais disfunções mentais não raramente estão relacionadas com crenças que se foram instalando ao longo da vida do indivíduo, como a persistente assumpção da negação de ser amado, por exemplo.

Não que haja nada de errado em querer que as pessoas nos amem e nos valorizem, mas a raiz dos conflitos internos pode estar no facto de condicionar o próprio bem-estar emocional à aprovação alheia, e aqui reside uma das causas do sentimento de solidão.

Falemos da solidão

Segundo o que se lê nos dicionários, a palavra solidão representa o estado ou a condição de estar só. Mas esta não passa de uma explicação simplista e subjectiva. Enquanto há quem aprecie o seu voluntário isolamento, e o aproveite para reflectir, criar, ou mesmo redescobrir-se, outros há – que constituem a grande maioria – que podem sentir-se angustiados com a persistência desse tipo de vivência em isolamento.

Sentir-se sozinho num momento ou outro é uma sensação natural e pode acontecer até com as pessoas mais bem-resolvidas emocionalmente. Mas sustentar esse sentimento por um período prolongado de tempo, pode provocar sérios impactos na saúde mental e física do individuo.

A depressão

A depressão não é a único distúrbio mental alarmante do século XXI. Os diagnósticos de ansiedade também são crescentes em todo o mundo. O excesso de informação e as múltiplas demandas do dia-a-dia, típicos da vivência contemporânea, contribuem para os pensamentos acelerados e desorganizados.

Actualmente, a depressão é um dos transtornos mais preocupantes da personalidade e pode afectar pessoas de qualquer grupo etário. Nas crianças e adolescentes o fenómeno apresenta-se em crescendo, com sintomas depressivos, que no limite, podem ir até à fixação suicida.

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A depressão pode ser conotada tanto como causa como efeito da solidão, e a falta de convívio e a ausência da troca de afectos. Todos deles se constituem como potenciais factores determinantes para o desenvolvimento de quadros depressivos.

Outros indícios clássicos da depressão que são agravados com a solidão incluem: a baixa auto-estima; a tristeza; a irritabilidade; a desesperança e o pessimismo, além dos sentimentos de inutilidade, e ainda uma ansiedade continuada.

Em tempo de futuro incerto que vivemos, são muitas as preocupações que invadem a nossa mente, causando aflição, stress e ansiedade. O turbilhão de emoções geradas pode ser devastador para algumas pessoas, que, além de se fecharem em casa julgando assim evitar um inimigo que mão sabem identificar, são, compreensivelmente, incapazes de evitar as “agressões” que constantemente lhe chegam pelas televisões, sua única companhia no isolamento do lar.

O Isolamento Social

Os efeitos da solidão ainda podem incluir sentimentos de perda, de privação e de não-pertença. O sentir-se excluído — mesmo que essa exclusão seja auto decidida — pode gerar sentimentos de forte ‘dor’ emocional.

Crenças do tipo “não mereço ser amado” são reforçadas quando a pessoa associa essa percepção aos seus vínculos sociais. As distorções cognitivas por trás dessa visão negativa fazem o indivíduo solitário isolar-se ainda mais. Os elementos cognitivos têm importante papel no modo como estes factos são interpretados.

Isso significa que, de modo não intencional, as pessoas podem perpetuar a sensação que mais temem; ficar em solidão.»

Efeitos da solidão na saúde física

Aduzindo ao que atrás se aborda, sabe-se que “a solidão projecta as sensações de apreensão, insegurança, inquietude e desesperança, e a mensagem enviada ao cérebro é a de que o corpo está sob stress. E, consequentemente, o organismo pode responder com alterações fisiológicas como o aumento da pressão arterial; as perturbações no sono; as falhas no funcionamento do sistema imunológico; o risco (aumentado) de problemas cardiovasculares, e uma maior propensão à diabetes tipo 2 e ainda uma redução drástica na sensação de bem-estar.

A somar a tudo isto, a sensação de vazio, um dos principais efeitos da solidão, pode transformar-se num estímulo para o abuso de álcool e outras drogas. A busca por alívio emocional também tem efeitos na alimentação, potenciando a obesidade e outros distúrbios, físicos e psicológicos, associados a um comportamento alimentar disfuncional”.

A importância do convívio social internético para atenuar os efeitos da solidão

Com o fácil acesso a milhares de contactos por meio da internet, abrem-se ao ser solitário ilimitadas possibilidades de interagir com outras pessoas. Conviver assim garante partilha, divisão de angústias e multiplicação de reforços positivos. Porque afinal, a atenção partilhada ainda é uma das principais fontes de reforço emocional, apoucando assim os eventuais efeitos provocados pela solidão.

Conclusão

Apesar dos tantos efeitos descritos da solidão, persistem perguntas e respostas por trás do vazio de ‘estar sozinho’. São questões que carecem de ser exploradas para compreender o porquê de algumas lacunas que não podem ser preenchidas quando a única companhia que temos portas adentro, é, na maioria dos casos; a nossa!

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1 comentário

  1. O poeta nos fala sobre a solidão…
    acredito ser o mal desta época, as pessoas estão cada vez mais sozinhas, às vezes dentro da mesma casa.
    O mundo não é o mesmo, outro mal que nos afeta é o fato de qualquer coisa que se diga, seja ofensa, as pessoas sentem-se ofendidas por quase nada…
    os tempos mudaram, nós da terceira, quarta, idades, precisamos nos ocupar , a verdade é jovem não quer conversa com idoso, por mais que seja atualizado…
    Eu gosto um pouco de minha privacidade, já passei do tempo da casa cheia, a minha “solidão” é minha, sem isolamento, mesmo por que não tenho “pique” pra atender a muitos, mas sempre tive casa cheia.
    PARABÉNS aos poetas pelo dueto !
    O Tiago Barroso, nosso “antigo” amigo da internet…fiquei feliz ao vê-lo aqui, com também ao querido Eugénio de Sá!
    Registro meus agradecimentos pelo convite e deixo meu abraço aos nobres poetas lusitanos amigos!

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