BICADAS DO MEU APARO: Crimes por julgar

Artur Soares

Escritor d’ Aldeia

 

O Sr. Coronel Vasco Lourenço, numa entrevista concedida afirmou: “vejo o poder financeiro dominar o poder político. Vejo os políticos a venderem-se ao poder financeiro”. “Isso gera corrupção, que tem estado na origem da crise”. “A crise de valores fez-nos cair numa situação em que cada dia me envergonho mais pelos dirigentes que tenho”.

Não sei se o Sr. Coronel (nomeado) sente algum apreço, se é que existiam, por valores antes do 25 de Abril de 1974. Sente, isso sei – porque o afirma – que os políticos actuais se vendem e que a crise existente é devida à corrupção em que vivem e que organizam. Se assim é, temos nesta forma de fazer política em Portugal, acção criminosa.

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Mário Soares, em 1978 e para desagrado da Federação da Área Urbana de Lisboa, (F.A.U.L.), do Partido Socialista, afirmou que “tanto Américo Tomás como Marcelo Caetano podiam regressar (do Brasil) desde que respondessem por “actos praticados” durante o seu regime”. Logo, há falta de julgamento a dois políticos por “actos praticados” (crimes), durante o regime derrubado.

Portugal está cheio de acontecimentos que averiguados e rigorosamente analisados à luz da Lei, da Razão e da Moral dariam actos criminosos. Recordemos a democracia/musculada da II República, a ausência física de militares na guerra de 40/45 e, devido a isso, os milhares que morriam à fome, com falta de medicamentos, que tuberculizavam famílias inteiras, porque Salazar mandava para a guerra minérios e mantimentos chamando-lhe “as sobras de Portugal”. Porque não foram para a referida guerra, não morreram militares, mas até 1955 morria-se de fome e com tuberculose. Até crianças morriam pouco depois de nascer porque eram filhos de pais ossificados. Também aqui há crimes e ninguém os julgou.

Quem desconhece crimes nacionais na banca, nas empresas, nos negócios feitos na escuridão do tempo, nos vendidos de que fala Vasco Lourenço, nos incompetentes que têm soterrado o país e na mendicidade a que nos submeteram? Portugal gangrena em corrupção, em todos os sectores da vida social.

Não foi crime contra os portugueses, José Sócrates e Pedro Passos Coelho desviarem parte das pensões de pensionistas e de ordenados na função pública, para entregarem aos usurários do capital? Quem julga estes responsáveis e tantos outros que desde Abril de 1974 se sentam à volta das mesas com lagosta e champanhe gelado?

O acidente aéreo de há dezenas de anos em Camarate que vitimou Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e outros, não foi crime? Não foi uma bomba que dentro do avião explodiu? Onde está esse julgamento e quem são, concretamente, os culpados?

Quem julgou os responsáveis que abandonaram o povo de Timor-Leste ao sabor e ao gosto da Indonésia? Quem julgou Mário Soares por ter andado à procura dos guerrilheiros da FRELIMO em Moçambique e ter-lhes entregue o poder à revelia do programa da Forças Armadas (de então), originando desse modo a guerra civil que travaram aqueles e Angolanos, durante tantos anos? Quem julgou Álvaro Cunhal e o Almirante Rosa Coutinho que foram responsáveis por sevícias a milhares de brancos e negros em Angola, devido à sua consciente indiferença para com o povo em que o Almirante era responsável?

Rosa Coutinho, Almirante do regime de então e com ordenado a ser-lhe pago dos impostos dos portugueses ao serviço de Angola, com o 25 de Abril, e aquando do início da descolonização, mandou o presente do ofício a Agostinho Neto – fotocópia que adquiri oferecida por um escorraçado de Angola – e que passo a transcrever:

“República Portuguesa – Estado de Angola – Repartição de Gabinete do Governo-Geral.

Luanda, aos 22 de Dezembro de 1974

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“Camarada Agostinho Neto: Após a última reunião secreta que tivemos com os camaradas do PCP, resolvemos aconselhar-vos a dar execução imediata à segunda fase do plano.

Camarada Agostinho Neto, dá, por isso, instruções secretas aos militantes do MPLA para aterrorizarem por todos os meios os brancos, matando, pilhando e incendiando, a fim de provocar a sua debandada de Angola. Sede cruéis sobretudo com as crianças, as mulheres e os velhos para desanimar os mais corajosos. Tão arreigados estão à Terra esses cães exploradores brancos que só o terror os fará fugir. A FNLA e a UNITA deixarão assim de contar com o apoio dos brancos, de seus capitais e da sua experiência militar. Desenraízem-nos de tal maneira que com a queda dos brancos se arruíne toda a estrutura capitalista e se possa instaurar a nova sociedade socialista ou pelo menos se dificulte a reconstrução daquela”.

Crimes por julgar: democracia onde o povo dorme ou que injectado vive.

P. S. O autor não escreve segundo o novo acordo ortográfico.

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