Cidades Invisíveis

Li o Visconde Cortado ao Meio, uma obra de Italo Calvino, um conceituado escritor cubano, depois radicado em Itália, de um folgo.

Porém, não vou apresentar o livro, que acho que devem ler, ou falar acerca do autor. Gostaria de dar a minha opinião acerca desta história que, mesmo que aparente ser simples e infantilmente fictícia, tem uma vastidão de significados que só o leitor pode tentar desvendar.

A história, tal como o nome indica, fala sobre um visconde que foi cortado ao meio, em duas metades. Jovem, e na guerra, acabou por ser atingido à queima-roupa por uma bala de canhão que fez o dito serviço.

As duas partes do jovem foram encontradas por pessoas diferentes e curadas, dando não uma, mas duas vidas ao visconde: uma que continha toda a malvadez do visconde: causava incêndios, enforcava pessoas por crimes insignificantes, era o mal em pessoa; a outra metade assume um papel íntegro, moralmente correto, de uma ética inquestionável.

O que acontece? Depois de várias peripécias, as duas metades acabam por se juntar num duelo mortal. Ambas morrem e o visconde acordará, depois, vivo e completo.

O livro pode ser interpretado de várias maneiras. As duas metades argumentam que o facto de serem metades as torna mais completas, como se conseguissem ver o mundo e a sociedade de uma forma mais transparente. Na verdade, viam o mundo de formas muito profundas, mas unilaterais. Mesmo a metade boa, que só pretendia fazer o bem e obrigar os outros a que o fizessem, não conseguia compreender que somente o bem, por vezes, não trazia a felicidade. A metade má não compreendia que a crueldade, autoridade e frieza não são sempre necessárias para governarem e organizarem uma sociedade. No fundo, uma pessoa precisa de ser completa para pensar racional e emocionalmente, ter a capacidade de ver um todo e nele, nas diferenças, construir a harmonia.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Na minha opinião, este conto ensina-nos que não se pode ser extremo nas decisões e atitudes.

Temos hoje uma guerra aqui ao lado, e o absurdo que ela cria, temos as migrações e a dor e morte que elas provocam, temos um mundo que não preservamos e diariamente destruímos mais um pouco o seu meio natural, temos as autocracias que limitam liberdades e impõem ideias que querem como certas e eternas.

O que imagino, e têm de ler outro livro do Italo Calvino, As Cidades Invisíveis, que através da nossa capacidade de sonho, de imaginação, de construção de ideias humanistas, podemos construir um futuro onde todos se integrem nas suas diferenças e exista o respeito mútuo e universal de cada ser humano por cada outro ser humano. As Cidades Invisíveis são essas imaginações, esses mundos, esses sonhos tão livres que todos podemos construir. Nessas cidades, o visconde podia ser dividido em múltiplas partes, não sei se o corpo dele resistiria a tantas divisões, mas tenho a certeza que os pensamentos e atitudes tinham de partir do equilíbrio e do respeito por cada ideia, por cada momento, por cada vida e pensamento.

O mundo seria, de certeza, diferente e melhor e sempre que leio penso que as palavras e as nossas atitudes são uma forma de transformação onde todos podemos e devemos participar.

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5 comentários

  1. Discordo das palavras, como armas.
    Hoje o silêncio, responde.
    Atos, fortes, é a forma.
    Um ano de guerra.
    Palavras e morte.
    O diálogo objetivo.
    Fortes unidos, na desunião, e tentar um período de paz.
    Como não sei.
    Guerra com humanos tem limite, na força humana
    Houve uma Guerra dos 100 anos.
    E os … estão em guerra há 100 anos.

  2. Obrigado Daniel tenho sempre muito interesse nos teus textos, pela reflexão que fazes, pela tua partilha.

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