CREMILDO PEREIRA: Um nome ilustre para ser lembrado

António J. Coelho da Cunha

Empresário Luso-brasileiro 

(Rio de Janeiro)

 

Tem mais de 10, talvez 15 anos, escrevi e foi publicado no Jornal Maria da Fonte, periódico centenário da região do Minho, um texto em que falava, entre outras citações, da figura do Sr. Cremildo Pereira.

Suas estórias, focadas na História de Portugal e na história de sua vida que começou na região com a Freguesia de Geraz incluída, eram razões de muito apreço e acrescentavam bastante ao nosso conhecimento, alimentando o amor ainda sentido dos tempos de criança vividos na aldeia: Guichomar, Pena, Fijô, Fontão, Santa Tecla, Quintães, ou no Olival onde estava a escola onde aprendi a ler e escrever, sob o comando do Prof. Joaquim Guimarães. Ou nas Freguesias vizinhas: Monsul, Águas Santas, Moure, Ferreiros, São João De Rei, Rendufinho. Ou Verim às margens do Rio Cávado, onde tantas vezes o atravessei de barca para do outro lado da margem para trocar milho por farinha …. Ou da Ponte do Porto quando me dirigia à Feira Nova ou Amares para tingir roupas com tinta preta, para o luto de minha avó Beatriz de Trástola, hábito que conservava ao ficar viúva, ainda bem nova, de Antônio Joaquim Coelho, meu avô, da Quinta da Pena (irmão do Albertinho da Pena).

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Hoje, depois de 65 anos vividos no Brasil como emigrante português, posso dizer que estou adaptado à sociedade que me acolheu e perfeitamente integrado pela formação da família que aqui constitui, com esposa, filhos, genros e nora, e agora os netos Caroline, Guilherme, Benjamim e Valentina. Mas ainda assim com uma vontade marcante de poder rever os caminhos por onde andei. Sentir os traços culturais que me serviram de berço, sentindo o povo da minha terra. Não mais, talvez, os que me viram nascer, e que, de muitos, guardo profundas recordações.

O emigrante, ao deixar a sua terra, parte dolorido, esperando o regresso que na maioria dos casos não acontece, transformando-se em sonho e nunca mais realidade, resultando em sofrimento ao ter que viver longe da sociedade que nunca desejou deixar e não podendo, agora, pensar em se afastar de outra que lhe deu amparo e condições de vida.

E quando a vida lhe concede oportunidades para retornar e voltar a viver com seu povo, o desafio também é grande, se considerarmos que os amigos cresceram e muitos já partiram deste para o outro mundo e o relacionamento com os que vieram depois, por força da distância de algumas décadas, impõe-se a necessidade de readaptação, da revisão de conceitos, de hábitos e de costumes, não mais aqueles dos anos passados e que diferem dos hábitos do país que o acolheu, no meu caso o Brasil. Podem acreditar, não é fácil !

O tempo passa, mas as emoções no coração do emigrante se refletem e reconstituem imagens de saudade que provêm dos primeiros anos de vida pelo ensino da forma de estar no mundo, com o sentimento muito forte de ser português. Depois de afastado da terra onde nasceu e dos seus, ao conhecer novas terras, outras pessoas e outras culturas onde se acrescentaram novos elementos à sua formação, ao migrar com 14 anos, em 13 de janeiro de 1954, fica difícil pensar em retornar. Mas as origens nunca são esquecidas, pelas oportunidades de contato com pessoas queridas, objetos, culturas e imagens do meu Portugal, do qual sou oriundo.

E uma das pessoas que alimentavam em mim esse sentimento era CREMILDO PEREIRA a quem mais uma vez gostaria de prestar homenagens, havendo por parte do MINHO DIGITAL aquiescência para tanto.

Um nome para a imortalidade…

Quando de sua passagem desta para outra vida, a notícia me foi passada pela internet, tendo origem em Paris, quando um de meus primos, Adelino Morais assim se expressou:

“O nosso amigo CREMILDO PEREIRA do lugar da Bouça em GERAZ, nos deixou, partindo para o outro mundo.  Homem que escreveu muitas “crônicas”. Um sujeito da HISTÒRIA DA POVOA DE LANHOSO e não somente de Geraz. Apreciava demais as suas crônicas. Era homem muito estimado. É uma grande perda”.

Confirmou-se a notícia com o recebimento da edição datada de 18 de março de 2005, do Jornal Maria da Fonte, ao ler a pequena nota na página seis, sobre os Povoenses que desaparecem. O falecimento de Cremildo Pereira em 10 de março de 2005, já tem 15 anos!  E me pergunto por que os fatos se repetem. CREMILDO PEREIRA não foi um cidadão comum. Sua presença valorizava o  Jornal “MARIA DA FONTE”. CREMILDO PEREIRA era referência e veículo de ligações com a história da Póvoa de Lanhoso. Apesar dos longos anos vividos em Moçambique, nunca se distanciou das suas origens, e através das estórias que o ” Maria da Fonte” publicava, nos transportava até os tempos de nossos tataravôs e não raro descobríamos particularidades que não nos foram passadas pelos mais íntimos, tão boa era a sua memória ou bem apurada era a sua pesquisa visitando bibliotecas ou arquivos esquecidos pelo tempo.

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Disse eu no texto: Perdeu a Povoa de Lanhoso. Perdeu o “Maria da Fonte” por entender que nós, os leitores, somos parte importante da existência deste tradicional jornal, com mais de 100 anos de existência, que muito honra os que por aí nasceram, quer sejam residentes em Portugal ou espalhados pelo mundo, levados pelo destino, como que pelo vento que os induz à busca de aventuras que nem sempre a nossa terra natal oferece para seus filhos. A coluna onde são publicados os nomes dos que renovam ou fazem assinaturas, e que eu sempre leio à procura de pessoas do meu tempo, nos dão a informação dos inúmeros lugares onde é lido “o Maria Fonte”. Cremildo Pereira há muitos meses não mandava matéria para a redação. Mas cada edição que chegava, trazia com ela a esperança de se voltar a encontrar a presença do amigo que nascido no início do século XX, e que no início do século XXI, nos contava histórias do século XIX com a clareza e suposta vivência, mesmo sem nela ter vivido.

Conheci as terras e a casa que pertenceram a seus pais, e em cujas paredes retratos de meus antepassados figuravam. Disso tenho provas por algumas cartas que me enviou para o Brasil, juntamente com trabalhos de sua autoria, os quais, se valor já tinham em meus arquivos, passarão a ter muito mais, como preito de honra a um homem que respeitava as suas origens, não obstante tenha conhecido outros mundos.

Com meu preito de gratidão, apresento seu nome como candidato à imortalidade.

 

Nota: O texto foi publicado em 2005, no Jornal Maria da Fonte. Com algumas informações atualizadas e contando com a disponibilidade do Jornalista Manso Preto, retorno a comentá-lo para publicação em MINHO DIGITAL, num preito de homenagem a quem tanto se interessou em destacar acontecimentos históricos, principalmente na Região da Póvoa de Lanhoso.

Peço licença ao pesquisador atual José Abílio Coelho e indico na internet, uma página de sua autoria, com dados biográficos de CREMILDO PEREIRA.  http://dicionariodepovoenses.blogspot.com/2011/04/cremildo-pereira-1911-2005-historiador_26.html

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