Página em Branco

Estou sem ideias para esta crónica. E, enquanto os meus ouvidos são enlevados por batidas musicais, os ouvidos de pessoas em redor do mundo são torturados por ruídos que não se deviam ouvir nunca.

E, sem qualquer pensamento que me deixe prosseguir as ideias neste texto, é interessante pensar que, se os líderes não tivessem ideias para os seus discursos bélicos, nenhuma pessoa no mundo teria de ouvir ruídos de destruição.

Imaginem agora um líder de uma nação, pronto para invadir um país vizinho. Rodeado de jornalistas amontoados com as suas ferramentas de informação nas mãos, rodeado de câmaras que se preparam para transmitir e fotografar história, rodeado de colegas que podem ou não apoiar a sua decisão. Aparentemente confiante e preparado, repara que o papel que tem como guião é uma página em branco.

Então, agora tentando esconder a inquietação, o líder bebe gentilmente um copo de água pousado no canto superior direito da mesa onde se senta, ajusta a sua gravata lustrada e levanta-se para poder falar com clareza para todos.

E assim se mantém, segundos, talvez minutos, o centro das atenções de milhões. Já nem se conseguia lembrar do que ia falar sem o papel. Sentia-se cada vez mais pesado, menos consciente, e o branco do papel engolia-o. E assim caiu atordoado no chão. Uma guerra foi impedida pelo branco do papel.

As notícias, que iriam abordar o início de um conflito armado, acabaram por abordar o súbito lapso do líder.

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Gostava que mais papéis brancos, sem ideias, sem vida, sem nada, pudessem ir para as mãos de líderes que quisessem causar destruição sem saírem das próprias casas. Esse tempo ainda não chegou, talvez nunca venha a chegar. Mas a vida teria mais sentido se nós não nos matássemos. Ah, e observem como acabei por escrever a minha crónica.

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3 comentários

  1. Ainda bem que a escreveste Daniel. Todos nos devemos levantar, papel em branco, dando lugar aos outros…sem discursos vazios.

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