A Saúde é um direito inalienável e universal

Antonieta Dias

(Médica) 

Presidente do Congresso Nacional Nova Visão para um Sistema de Saúde

A exigência na melhoria do acesso à inovação, aos produtos e tecnologias mais adequados para combater a doença passa pelo uso das tecnologias aplicadas de forma racional, segura e eficaz.
Sem dúvida que a sustentabilidade de um sistema adequado para cuidar melhor o doente, obriga a investir em tecnologia, em incentivar os profissionais, em dar liberdade de escolha nas opções terapêuticas e a ter uma política do medicamento baseada na evidência científica.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Obviamente que nenhuma adesão à terapêutica funciona se não existir credibilidade médica e sem criação de um ambiente institucional que assegure as condições de promoção e investimento na saúde.
De acordo com os dados do Eurostat, o valor do PIB em despesas da saúde é muito inferior ao da média europeia.
Certo é que a saúde é o segundo maior gasto público da comunidade única, logo depois das despesas com a proteção social (19,2%).

Os países que lideram a tabela são a Dinamarca (8,6%), a França (8,2%) e a Áustria e a Holanda (ambos com 8,0%), sendo que abaixo se situa o Chipre (2,6%), a Letónia (3,8%), a Roménia (4,2%) e a Grécia (4,5%). “O ranking é bastante diferente quando os montantes gastos são comparados com a população de cada estado-membro.

Estes dados demonstram claramente que Portugal tem vindo a desinvestir seriamente no Sistema Nacional de Saúde, o que gera nos cidadãos um sentimento de insegurança e de incerteza quanto ao futuro do SNS.

Com o sucessivo agravamento das condições no nosso SNS, o problema foi-se tornando central para todos os médicos e profissionais que decidiram consagrar a sua vida à saúde do próximo o que despoletou há cerca de 6 meses a ideia organizar um congresso sobre uma Nova Visão para um Sistema de Saúde.

Esta ideia ganhou forma quando um amigo meu conhecendo as minhas preocupações sobre a fragilidade do sistema e a minha sensibilidade e dedicação a esta nobre causa publica me desafiou para fazer um congresso destinado a refletir sobre esta problemática.

Desta ideia nasceu a vontade e determinação de passar da teoria à prática e organizar este congresso para se falar abertamente de Saúde em Portugal, de uma forma livre, sem qualquer conotação politica ou qualquer tipo de influencias que não fossem ajudar a construir e a defender um Sistema de Saúde que responda às carências e alivie o sofrimento dos doentes e dos profissionais que não sabem mais que fazer para voltar a colocar o SNS a funcionar com resposta atempada, com humanidade e com recursos disponíveis para bem cuidar os doentes e satisfazer as suas necessidades de saúde com dignidade e saber científico.

Ao aceitar este desafio enveredei os esforços necessários junto das pessoas que considerei mais habilitadas para debaterem as diversas áreas da Saúde, desafiando-as também partilhar os seus conhecimentos e a participar graciosamente neste congresso, com cariz idóneo, pro-bono, sem patrocinadores de qualquer género, sem cores políticas, resumindo: sem interesses pessoais além do debate e transmissão de ideias credíveis e passiveis de colocar em prática de forma a garantir a sustentabilidade do SNS.

Este foi o propósito para uma construção positiva, sem críticas com o objetivo único de ajudar.

Toda a logística e organização desare evento tem sido literalmente feita por nós, tentamos incluir sobretudo as áreas da Medicina mais sensíveis, uma vez que seria impossível abordá-las todas.

PUB

Achamos que desta forma teríamos uma boa base para o debate de ideias que se quer global e não apenas limitado às particularidades de cada área.

O fato de este congresso ser realizado sem patrocinadores criou-nos uma responsabilidade acrescida mas contudo gratificante pela liberdade que nos deixa e exclui conotações, vínculos partidários ou interesses comerciais.

Achamos que este aspeto era essencial para não colocar em risco a nossa isenção, idoneidade e a nossa vontade de ajudar o próximo que tanto de nós precisa sem dependermos de outras estruturas que limitariam certamente este nosso desejo.

A isenção total de todos os intervenientes, era determinante para o impacto social deste evento e com certeza que o nosso o exemplo irá naturalmente despertar o interesse da população em geral que não se sentirá sozinha na defesa de um bem essencial que traduz direito inalienável e universal à Saúde

Acreditamos que a nossa união e solidariedade social marcarão o pilar de mudança, de compromisso e de compreensão desta problemática que define quando bem estruturada o poder e a garantia civizacional de um País.

Queremos deixar bem claro que o que nos propomos fazer é pura e exclusivamente um ato de cidadania e não uma forma de favorecer um qualquer interesse oculto, eliminando desta forma essa hipótese.

 

Organizamos um congresso que terá naturalmente algumas limitações porque não conseguimos abranger todas as áreas, todavia, fizemos um programa que julgamos equilibrado, tentando explorar as várias áreas-chave do sistema de saúde actual, quer tendo em conta as novas tecnologias e o envelhecimento da população portuguesa, quer a importância dos sistemas de abordagem inicial da doença e emergência, quer a necessidade premente de fazer crescer algumas áreas no SNS (como a Psicologia e a Medicina Dentária), e claro, pensar na sustentabilidade e missão que o SNS tem como garante dos mais básicos direitos humanos: à vida, à saúde e à igualdade. 

Esta tarefa não é fácil e as mesas redondas que estão programadas reúnem médicos, gestores, advogados, e outros profissionais excelentes designadamente da área das finanças que irão colocar a sua experiencia e a sua Sabedoria ao Serviço do Sistema Nacional de Saúde em Portugal.

Todos sabemos que a sociedade se tem vindo a modificar exigindo mudanças a vários níveis: se por um lado a tecnologia tomou já conta de inúmeros processos, simplificando-os, por outro lado a alteração demográfica e social que temos sofrido tem vindo facilitar o agravamento da sustentabilidade do SNS.

Será que não se conseguem otimizar procedimentos e desburocratizar soluções com os recursos humanos e económicos existentes?

Somos reconhecidos internacionalmente pela qualidade dos nossos profissionais de saúde somos pioneiros em diversas áreas quer de saúde quer nos procedimentos de emergência. Somos reconhecidos pela universalidade do nosso SNS. Dispomos portanto da matéria-prima sem a qual nada seria possível, resta-nos conseguir unir o que temos de melhor, utilizar de forma contida e racional a gestão dos recursos, investindo na educação para a saúde numa gestão criteriosa e competente dos vários serviços, que em vez de limitar transversalmente, consiga otimizar recursos. Se fosse fácil resolver esta questão, o problema não existiria porque os diversos Governos que tivemos nos últimos anos ter-se-iam assegurado disso. Não é um problema que se resolva sem consensos e sem trabalho de equipa. Será fundamental a consciencialização e a educação em geral para a saúde de forma que o sistema se torne mais eficaz.

O modelo atual do SNS tem de sofrer alterações de fundo para se alcançar melhores resultados.

Apesar de já ter havido algumas tentativas de solucionar o sistema, as alterações, tem de ser mais profundas e sustentadas.

O processo organizativo de cada serviço tem de ser adaptado às realidades e com os objetivos bem definidos para o fim a que se destinam.

Cada serviço tem de conseguir otimizar os processos e se houver necessidade de aplicar novos modelos, terão de ser obrigatoriamente eficazes para o bom desempenho dos vários prestadores, mesmo que isso implique diferença e aplicabilidade de ações inovadoras, sem contudo esquecer os resultados finais da produtividade, da rentabilidade e da eficácia na execução.

De nada serve chegar a um serviço e mudar tudo só porque é mais moderno ou porque funcionou muito bem num outro país qualquer. Realidades diferentes precisam de abordagens diferentes, e é aí que a simbiose entre os profissionais de saúde portugueses e as áreas de gestão hospitalar se torna essencial.

Para que essa simbiose ocorra tem que haver vontade, solidariedade e tolerância entre todos, já que o cerne da questão não é outro que não garantir que um cidadão doente que recorra ao SNS seja atendido duma forma humana, receba de forma célere os melhores cuidados pois o exercício da medicina tem de ser sempre baseado na qualidade, no conhecimento científico e no desempenho profissional exercido com humanidade ao serviço dos doentes.

 
Sem dúvida que a sustentabilidade de um sistema adequado para cuidar melhor o doente, Obriga a investir em tecnologia, em incentivar os profissionais, em dar liberdade de escolha nas opções terapêuticas e a ter uma política do medicamento baseada na evidência científica.
Obviamente que nenhuma adesão à terapêutica funciona se não existir credibilidade médica e sem criação de um ambiente institucional que assegure as condições de promoção e investimento.

Apesar de estarmos a viver uma fase de mudança social que implica uma séria reestruturação de Serviços e das Instituições, a vida humana tem de continuar a ser respeitada.

A defesa da vida passa pela necessidade de manter os apoios preconizados que foram criados com objetivos bem definidos, no que se refere ao princípio básico de manter a sustentabilidade da dignidade humana.

Estas regras elementares de que depende a valorização da vida, não podem de forma alguma ser destruídas por razões economicistas e exclusivamente baseadas em fórmulas matemáticas, onde as pessoas são substituídas por números.

Somos confrontados com um maior número de casos de pessoas que necessitam de apoio de terceira pessoa, devido ao seu elevado grau de dependência e a um crescimento populacional de idosos que residem sozinhos ou têm como cuidador um outro idoso, que também necessita de ajuda.

Esta situação já de si constrangedora tem sido agravada pela falta de resposta nalguns setores da saúde e pelo não investimento na manutenção, no equipamento, nos recursos humanos e no encerramento de algumas unidades de saúde básicas para um apoio social adequado à realidade que estamos a viver, sendo desajustada para responder às inúmeras solicitações que surgem diariamente.

Este facto tem sido gerado pelas restrições e pela precaridade económica que vivenciamos atualmente.

Se é certo, que esta realidade é inevitável, devemos pelo menos investir num projeto que consiga responder à satisfação das necessidades básicas e seja o suporte social para colmatar este grave problema, que nos assusta por desencadear ainda mais a vulnerabilidade e abalar a resistência à sobrevivência humana.

Algumas medidas devem ser consideradas como uma prioridade, para a manutenção de uma qualidade de vida com padrões adaptados e rigorosos, que não prejudiquem sobretudo quem já se encontra carenciado e sem autonomia para resistir a tantas agressões (físicas, psicológicas e sociais).

O facto de a família ser um suporte insubstituível de coesão e apoio inquestionável temos de preservar a vida das pessoas cuidá-las e ajudá-las.

Criar suportes de apoio para os que não têm família ou foram simplesmente abandonados ou excluídos dela.

Esta vivência da perda é uma realidade cada vez maior na população portuguesa, e o estado social não pode matar a esperança destas pessoas, nem omitir ou simplesmente ignorar este drama social.

Por outro lado, não se pode pretender que estas novas exigências estejam explicitamente tratadas, por medidas legislativas, muitas vezes insuficientes, pouco reconhecidas e incompreendidas pela população em geral.

A dimensão moral da liberdade e da racionalidade levam-nos a reconhecer que teorias filosóficas não sustentam a autonomia nem a riqueza humana.

Tudo aponta, para a necessidade de fazer uma análise detalhada da realidade em que vivemos e que a mensagem daí resultante seja autêntica, que ultrapasse a mera promessa de uma boa intenção.

Mais grave será ainda, se as medidas adotadas não preservarem a vida e a considerem como um castigo ou um pecado.

Todos sabemos que os fins não justificam os meios e mesmo que as medidas sejam boas é preciso traçar o caminho com um conteúdo de intenções onde a verdade, tem que substituir a mentira, onde a solidariedade humana exclua o egoísmo, em que o rumo a seguir passará pela obrigatoriedade de entender o valor do ser humano e humanizar a medicina.

A problemática moral do racionamento da medicina, não pode servir de árbitro e condicionar as fontes da vida humana e muito menos servirem como administradores dos desígnios estabelecidos por critérios políticos, onde o homem fica privado do domínio do seu próprio corpo.

Assim, à luz de uma cultura generosamente orientada para servir a vida, não podem existir impossibilidades ou limitações que coloquem em causa a confiança e a esperança de manutenção da vida.

Ninguém pode ser indiferente ou insensível perante alguém que está indefeso, diminuído físico ou psicologicamente, ou porque é deficiente ou idoso fica privado dos valores comuns da dignidade humana e dos direitos do próprio homem.

Viver em democracia é reconhecer o poder público como um bem comum titular do reconhecimento e da tutela jurídica dos direitos humanos.

Será esta uma visão pessimista da nossa realidade social? Ou será que a nossa existência tem obrigatoriamente de ser regida pela violência fatal e inevitável de uma sociedade e de uma história da humanidade condenada a uma insociabilidade e a uma cultura de vida não expectável, onde o nocivo impera sobre a opção da ética e sobre o verdadeiro crescimento natural do ser humano?

Será que estamos mesmo no fim de um ciclo democrático e de uma inversão dos valores, onde a corrupção e a mentira escravizam a liberdade e precisamos de um profeta, que transforme e ignore o materialismo vigente e passe a dar sentido à vida?

Será que a Europa vai continuar a ser uma sociedade multicultural, onde cada País vai ter direito à sua identidade cultural e religiosa?

Ou será que estamos a viver um momento sociopolítico de fraqueza, tendencialmente passeiro e efémera cuja durabilidade é curta e rapidamente surgirá a justiça, a paz e o homem passará a ter novamente direito ao diálogo e à preservação da vida?

Temos de acreditar que sim, e pensar que os valores universais, que os direitos invioláveis e inalienáveis, como a Saúde serão o suporte da dignidade da pessoa, exigíveis da tutela de todo um sistema jurídico, económico e social fundamental para a sobrevivência em democracia.

Por isso entendemos deste congresso sairá a Luz  para um novo caminho a percorrer para conseguirmos a melhoria da qualidade em Saúde  que desejamos e da qual já fomos pioneiros. Com certeza que as reflexões que aqui deixaremos nos ajudarão a percorrer um caminho conjunto com todos os que estiverem interessados em melhorar e contribuir para que o Sistema de Saúde Português volte a ter sustentabilidade, humanidade, acessibilidade e igualdade de acesso aos cuidados, tratando o doente como um Ser humano com a Dignidade, Ciência e Arte que merece.

 Presidente do Congresso Nacional Nova Visão para um Sistema de Saúde

Notícia relacionada e artigo de opinião:

https://www.minhodigital.com/news/congresso-nacional-nova

 https://minhodigital.com/node/14135/edit?destination=admin/content

  Partilhar este artigo