Editorial

CRÓNICAS DE TRAZER POR CASA: A VELHA DA UNHA JÁ NÃO ME METE MEDO
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Zita Leal

Zita Leal

Professora

(Aposentada)

Os sintomas vão ganhando terreno nestes últimos meses e o senhor alemão já bateu à porta como o carteiro do Neruda. Não sei até quando poderei barrar-lhe a entrada…

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Ainda hoje, atenta ao noticiário da tarde e sem nada que o justifique ( espero eu ) me lembrei de uma figura tenebrosa que dava pelo nome de “ velha da unha “. Nunca a vi mas atormentou-me a primeira infância quando eu fazia asneira atrás de asneira e a mãe me avisava que viria a velha da unha ajustar contas comigo visto eu não ter medo do chinelo nem da colher de pau. E eu não tinha medo mesmo. A mãe batia mas devagarinho. Medo, medo era da velha. Ela viria durante o sono cortar-me o polegar direito que tanta falta me fazia a substituir a chupeta. Sempre dormi de lado, encolhidinha com a mão direita debaixo da almofada,  polegar dobrado e oculto pelos outros quatro dedo. Posição igualzinha à das” manifes “ anos depois.

Cresci, casei e logo nas primeiras noites de cama partilhada, o meu homem me perguntou por que é que eu dormia com a mão debaixo da almofada com o polegar escondido. Respondi que era por causa da velha da unha e perante a sua cara de espanto, disse-lhe atabalhoadamente que eu não era bem-bem como a outra gente! Suponho que durante a nossa vida em comum, algumas vezes suspeitou que eu não era mesmo bem-bem…

A velha da unha de hoje vem de panejamentos negros, maléfica, voraz no desejo de consumir a alegria e a esperança. Não podemos ignorá-la escondendo-nos debaixo de uma almofada. Temos que enfrentar a situação sem tibiezas de “ deixa andar “ . E fazer-lhe frente é adiar o abraço amigo, o beijo terno, o afago de uma mão enrugada, o aconchego de um regaço. Morre-se de angústia na espera de um “ até já “ mas é preciso continuar  a acreditar que a esperança é verde!

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