Zita Leal
Professora
(Aposentada)
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Desculpa estarem atrasados os meus votos natalícios, mas sabes como é, bilharacos, coscorões, bacalhau, rabanadas apoderaram-se do meu tempo e muita coisa ficou por fazer, inclusive felicitar-te. Desculpa.
Eu não sou ninguém para te chamar a atenção e menos ainda ao teu Pai que segundo dizem é omnisciente e omnipotente, mas mesmo assim vou fazê-lo. Desculpa.
Ele enviou-te a este mundo para pregares o Amor, assumir os pecados dos homens de tal modo que até deixou que te crucificassem, mas algo falhou. Os homens continuam a pecar de consciência tranquila (mas não limpa…), guerreiam-se há séculos para afirmarem que a religião que professam é indiscutivelmente a única que salva, olham para o irmão não como igual mas como um ser inferior se a cor, o estatuto social, etc, etc não forem iguais ou compatíveis com os seus, diferenças que o Pai não previu (quero crer que não previu) mas que marcam a diferença entre uns e outros. Para isso não precisavas de ter sido martirizado. Desculpa.
O povo cá na terra diz aos miúdos que querem “ dar um passo maior que a perna “ e nem sempre conseguem: “ Ainda tens que comer muita broa para lá chegares “ e quando vejo as pessoas desta terra a agirem como se nunca tivesses cá estado trinta e três anos, como se a cruz, os pregos, os espinhos fossem pechisbeque das lojas chinesas a mascarar um títere, apetece-me dizer-te que o teu Pai falhou. As mulheres, os homens, as crianças vêem o seu futuro feliz adiado por tempos infindos.
Cabe-te a Ti dizer NÃO se te enviar outra vez para cá porque ainda será preciso comeres mais broa. Desculpa.
Espero que o teu pai te peça desculpa também.
Parabéns, meu Menino.
