Editorial

Sofrer por antecipação
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Damião Cunha Velho

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Sofrer por antecipação é uma aflição que causa muito sofrimento, desgaste físico e psicológico.

Sofre-se por causa de um acontecimento dramático que não aconteceu, mas que se imagina vir a acontecer.

Sofrer por antecipação é uma característica comum das pessoas ansiosas. O medo de que possa acontecer o pior dá asas à imaginação. O cérebro entra em modo “delírio” e os cenários mais catastróficos logo tomam conta do pensamento. A razão foi-se e o raciocínio não é guiado pela lógica, mas sim pelo pânico.

De um copo de água faz-se rapidamente uma tempestade. Depois, é uma bola de neve que cresce a cada tentativa de refletir. Uma reflexão selectiva que só escolhe as hipóteses mais dramáticas. Hipóteses que são praticamente certezas. É assim a vida de quem sofre por antecipação.

A maioria das vezes a solução para os problemas que nos surgem é muito simples.

O carro para na estrada e começamos logo a pensar que é uma avaria que não tem conserto. A seguir, já estamos a pensar que outro carro comprar, onde e como arranjar dinheiro para fazê-lo. Entretanto, suamos, ficamos com taquicardia, o mundo parece que vai acabar e o “porquê eu?” ou o “porquê logo a mim?” latejam nas têmporas ao ritmo do coração acelerado.

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O inferno instala-se.

É assim em tudo para quem sofre por antecipação. Vive-se cenários futuros imaginados a roçar o absurdo, que não vão existir, e isso é uma experiência desgastante com contornos patológicos. Na maioria dos casos, quando isso se repete, é uma perturbação de ansiedade, uma doença. Quando assim é, a solução passa por um tratamento médico.

Porém, para que alguém nestas circunstâncias se deixe tratar ou decida procurar ajuda tem que reconhecer que não há justificação para tanto alarme e algo, de facto, não está bem consigo. Se a razão comandasse, o exercício a fazer seria o de equacionar a possibilidade e a probabilidade de acontecer aquilo que nos vem à cabeça. E na grande maioria dos casos é possível, mas muito pouco provável. É possível morrer num acidente de avião? É. É provável morrer num acidente de avião? Eu diria que é tão provável como sair o Euromilhões.

Poderia referir inúmeras situações que despoletam esta sintomatologia. Dei, no entanto, o exemplo do carro que parou na estrada, sem se perceber a razão, porque é comum e ilustrativo de quem sofre por antecipação. É possível que o carro não tenha mais conserto, o mais provável mesmo é que apenas tenha acabado a gasolina.

Tão simples, para quê complicar?

O problema é que não é assim tão simples para quem sofre por antecipação. É que existem múltiplos factores que não dominamos que concorrem para que essa angústia ganhe corpo e que têm a ver com a nossa história de vida desde o berço. Mais uma vez, é o nosso cérebro a dizer que é extremamente complexo e que nós não mandamos nas maldades que ele nos pode fazer!

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