Editorial

Que saudades eu tinha deste mar!
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Arlinda Rego Magalhães

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Um olhar intenso e sofrido, fixa demoradamente o mar.

Os olhos verdes, quase transparentes, deixaram cair uma lágrima.

Estatura média, magra e o rosto ligeiramente vincado pelo tempo.

Em português correcto, referiu que estava em França, desde os dezanove anos. Casou com um português tinha três filhos e dois netos.

O filho mais velho tinha morrido, os outros/as estavam casados com companheiros de origem francesa.

Sobre Portugal falou da fome, das más condições de vida e de habitabilidade, da falta de trabalho bem remunerado, do assédio dos patrões e do curso que não pode fazer, por falta de dinheiro.

GOSTA DESTE CONTEÚDO?

Em França teve vários trabalhos, até ao dia em que encontrou um emprego de acordo com as suas habilitações literárias. Tinha concluído o antigo quinto ano de escolaridade, que corresponde ao actual nono ano.

A olhar fixamente para mim, segredou-me que a sociedade francesa, não era propriamente inclusiva, tolerante ou amável para com os portugueses.

As madames ridicularizavam as mulheres portuguesas, por terem um “buço” grande e visível e pêlos nas pernas. Os homens eram autênticos “burros de carga” e “escravos” de horas extras e de fins de semana sem descanso.

Ganhava-se muito bem, mas trabalhavam muito, nos sete dias da semana.

Juntaram dinheiro, construíram uma casa no lugar/terreno dos pais e agora compraram um apartamento à beira mar.

O casal está reformado e a senhora quer voltar para Portugal, mas o marido rejeita a ideia. Ele só fala em francês, já não tem cá amigos e ainda está revoltado com o país, que o obrigou a ir-se embora.

Além disso os seus queridos filhos e netos vivem lá, têm formação superior e bons empregos.

Ela ficou longos minutos em silêncio, e com lágrimas nos olhos segredou-me, que durante muitos anos, eles e outros foram tentando passar despercebidos em França.

Quanto mais “afrancesados”, nas roupas e na forma de falar, mais facilmente eram aceites, pelos franceses e portugueses do seu nível económico-social.

Os patrões, eram os patrões, não se misturavam!

Foi-se embora em silêncio.

A mágoa, a tristeza e a angústia eram óbvias.

Era uma dor intensa e profunda, a ferida aberta, de já não pertencer, de corpo e alma a lado nenhum!

As humilhações que sofreu, os insultos, os maus tratos e agora sente que os seus pés não têm raízes. O seu coração está apertado, dividido, isolado para sempre dentro do peito.

Foi um relato na primeira pessoa de uma vida, que passou diante daqueles olhos, que tinham saudades do mar.

Daquele maravilhoso mar, que desde menina a encantava.

Ao longe olhou para trás, abriu os braços, virada para o mar, depois cruzou-os sobre o peito, baixando a cabeça.

Só me apetecia chorar! Lembrava-me dos dezanove anos dela, e dos vinte e três anos, dos jovens de hoje.

Foram e ainda vão, todos à procura do sonho e de melhores condições de vida e de trabalho! Será que estes novos emigrantes, vão regressar em tempo útil, de modo a criarem raízes fortes em Portugal?

Desejo sinceramente que sintam saudades, muitas saudades deste mar, deste sol, destas serras e desta gente!

Os jovens acedem eficazmente, a todo o tipo de informação, formação e opinião, nacional e internacional.

Por isso, por favor não desistam! Lutem pelos vossos direitos! Cumpram o vosso dever de cidadania!

Não permitam, que outros venham para os lugares, que são vossos, por direito e por mérito! Não se deixem humilhar! Orgulhem- se das vossas raízes, do vosso passado, da vossa origem LUSA!

Portugal não é, mais uma opção de escolha profissional!

Portugal é a vossa melhor escolha! Lutem por ela!

Um país sem jovens e sem crianças, é um pedaço de terra e mar, sem futuro! Sem vida!

Que saudades vocês vão ter deste mar!!!!!!

1 comentário

  1. Liiindaaa e emocionante…descrição de uma vida igual a tantas outras…Quem não tem um familiar que não teve de emigrar???
    Hoje…os nossos filhos…pensaram em melhores condições de vida…mas…Nós mães “galinhas” que não concebemos a ideia da separação…pedimos calma…Que melhores dias virão…
    Sou GRATA A DEUS…não estão ” debaixo da as asas…mas estão perto…

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